Desindustrialização no Brasil: há evidências de aceleração no período Covid-19?
Desindustrilization in Brazil: is there evidence of acceleration in the Covid-19 period?
Revista de Economía del Caribe
Universidad del Norte, Colombia
ISSN: 2011-2106
ISSN-e: 2145-9363
Periodicidade: Semestral
núm. 32, 2023
Recepção: 23 Abril 2023
Aprovação: 02 Agosto 2023
Autor correspondente: cbsfernandes@uem.br
Resumo: Este artigo verifica se há evidências de intensificação do processo de desindustrialização no Brasil - dado o período recente mundial caracterizado como pandemia da COVID-19 - e investiga o papel da indústria de transformação no crescimento econômico via leis de Kaldor-Verdoorn. Os resultados indicam suporte para as leis de Kaldor e que há indícios de intensificação do processo de desindustrialização da economia brasileira durante a pandemia da COVID-19, destacando a importância da adoção de estratégias que foquem na reversão desse processo e que, possibilite, dessa forma, maiores taxas de crescimento econômico.
Palavras-chave: desindustrialização, COVID-19, Kaldor-Verdoorn.
Abstract: This article verifies if there is evidence of intensification of the deindustrialization process in Brazil - given the recent world period characterized as the COVID-19 pandemic - and investigates the role of the manufacturing industry in economic growth via Kaldor-Verdoorn laws. The results indicate support for Kaldor's laws and that there are indications of the intensification of the process of deindustrialization of the Brazilian economy during the COVID-19 pandemic, highlighting the importance of adopting strategies that focus on reversing this process and that, in this way, enable, higher rates of economic growth.
Keywords: deindustrialization, COVID-19, Kaldor-Verdoorn.
INTRODUÇÃO
Dados do IBGE (2021) indicam que o Valor Adicionado Bruto (VAB) da indústria de transformação passou de 132,81 bilhões de reais no quarto trimestre de 2012 para 174,59 bilhões de reais no quarto trimestre de 2019, registrando um crescimento real de cerca de 31,46%, enquanto o VAB da economia como um todo passou de 1.081,66 para 1.540,94 bilhões de reais, aumentando 42,46% no período, demonstrando assim que a economia como um todo cresce à um nível superior ao da indústria de transformação.
Assim, no Brasil, há grande preocupação com relação ao desempenho insatisfatório da produção industrial nos últimos anos, isso porque, a indústria, enquanto propulsora do desenvolvimento econômico, garante maiores inovações tecnológicas, contribui para a geração de superávit comercial, estimula o crescimento econômico, além de elevar a produtividade total da economia.
Embora, segundo Souza (2009), a produtividade do setor apresente crescimento, por causa da informatização e racionalização do processo produtivo, ao mesmo tempo liberam-se trabalhadores pelo uso de máquinas mais potentes e mais precisas, significando queda do emprego industrial. Esse fato, junto com a redução do valor adicionado da indústria no Produto Interno Bruto (PIB) e déficits crescentes na balança comercial industrial são indicadores de um processo de desindustrialização, que tem sido investigado por diversos autores, como: Maia (2020), Morceiro e Guilhoto (2019), Tregenna (2016), Oreiro e Feijó (2010), Nassif (2008), Feijó, Carvalho e Almeida (2005), Bonelli (2005), e Rowthorn e Ramaswamy (1999).
Nicholas Kaldor foi um dos primeiros autores a estudar profundamente a importância do setor industrial no crescimento econômico de um país. A aula magna que proferiu na universidade de Cambridge em1966 deu origem ao clássico artigo "Causes of the Slow Rate of Economic Growth of the United Kingdom", no qual o autor explica as razões para o baixo crescimento da economia britânica, em relação a outras economias desenvolvidas naquele período. A partir desse artigo e do artigo publicado em 1967 “Strategic Factors in Economic Development” Nicholas Kaldor formulou três leis sobre as causas do crescimento econômico. Essas leis têm sido testada empiricamente por muitos pesquisadores, por exemplo, Wells e Thirlwall (2003), Carcanholo e Porsse (2016), Dasgupta e Singh (2007) e Lamonica e Feijó (2011).
Conforme Wells e Thirlwall (2003) as leis de Kaldor podem ser resumidas em três principais. A primeira destaca que o crescimento do PIB é positivamente relacionado ao crescimento da produção manufatureira. A segunda relaciona positivamente o crescimento da produtividade do trabalho na manufatura ao crescimento da produção manufatureira, por causa dos retornos crescentes estáticos e dinâmicos de escala (também conhecida como Lei de Verdoorn). A terceira evidencia que há uma relação negativa entre o crescimento da produtividade do trabalho na economia como um todo e a taxa de crescimento do emprego no setor não-manufatureiro, isso porque a maior parte da atividade fora do setor manufatureiro está sujeita a retornos decrescentes de escala.
Assim, o objetivo deste artigo é analisar se há evidências de intensificação do processo de desindustrialização no Brasil, dado o período recente mundial caracterizado como pandemia da COVID-19, bem como, investigar o papel da indústria de transformação no crescimento econômico via leis de Kaldor. Este artigo contribui com a literatura de desindustrialização citada acima, ao incorporar no debate os possíveis efeitos da pandemia da COVID-19 e ao destacar a importância de políticas estratégicas que foquem no combate à desindustrialização do país. O setor industrial em especifico já passava por mudanças relevantes no período pré-pandemia com a introdução de transformação digital, pode-se assumir dessa forma que o período requer uma aceleração do processo de incorporação do uso da tecnologia como solução aos problemas tradicionais de desempenho, produtividade e eficácia.
Este trabalho está dividido em 6 seções, incluindo esta introdução. A segunda seção apresenta a conceituação de desindustrialização. Evidencia-se na terceira parte, a aplicabilidade das leis de Kaldor-Verdoorn para distintas regiões. Na quarta apresentam-se as estratégias metodológicas utilizadas e na quinta seção os resultados e discussões. O sexto tópico, por fim, é reservado às considerações finais.
I. DESINDUSTRIALIZAÇÃO
A desindustrialização é caracterizada de forma geral, como um contexto no qual tanto o emprego industrial quanto o valor adicionado da indústria diminuem como proporção do emprego total e do Produto Interno Bruto (PIB), ou seja, ocorre quando o setor industrial perde importância como fonte geradora de empregos e de valor adicionado para uma determinada economia (Rowthorn e Ramaswamy, 1999; Oreiro e Feijó, 2010; Bresser-Pereira, 2012). No entanto, Dasgupta e Singh (2007), ao investigarem 48 países em desenvolvimento, notam que é possível desindustrializar em termos de emprego e ainda não fazê-lo em termos de produção.
Há vários contextos em que a desindustrialização pode ocorrer. Ricupero (2014) salienta que quando a industrialização conclui com sucesso o processo de desenvolvimento, elevando a renda per capita a um nível alto e sustentável, o setor manufatureiro começa a declinar em termos relativos, como proporção do produto e do emprego. Portanto, a perda de participação do emprego industrial para o emprego no setor de serviços é tida como parte do processo natural do desenvolvimento econômico de qualquer país. Assim, a desindustrialização em economias avançadas não é um fenômeno estritamente indesejável, mas essencialmente uma consequência natural do dinamismo, devido ao contexto de crescimento rápido e pleno emprego no momento em que se atinge renda per capita elevada, essa dinâmica é pontuada também por Cano (2012) e Clark (1957) como desindustrialização natural.
Em consonância, Oreiro e Feijó (2010) consideram que a desindustrialização denominada “positiva” pode ser seguida por um acréscimo da participação de produtos com maior capacidade tecnológica e maior valor adicionado na pauta de exportações. Esse tipo de desindustrialização é um ponto a se alcançar por qualquer economia em desenvolvimento, ao passo que está associada com um avanço no nível de vida da nação (Mafra e Silva, 2017). Todavia, caso a desindustrialização seja acompanhada por uma “re-primarização” da pauta de exportações isso pode ser uma evidencia de ocorrência da doença holandesa[1] (Oreiro e Feijó, 2010).
O processo de desindustrialização é um problema quando ocorre em economias em que a renda permanece reduzida e em contextos de baixo crescimento econômico, o que é conhecido na literatura como uma espécie de “desindustrialização precoce”. Nesse caso, o processo de industrialização falhou antes de originar uma economia próspera de serviços, com uma estrutura produtiva modernizada e diversificada, capaz de absorver a mão de obra desempregada pela indústria (Marconi, 2015).
Para Tregenna (2016) é preciso diagnosticar se um país está se desindustrializando, mas também ir além e apontar quais são os setores que estão encolhendo. Isso porque o setor industrial não é homogêneo, existem setores manufatureiros de alta tecnologia e produtividade com encadeamentos produtivos, setores com altos salários e nível educacional elevado dos trabalhadores, e, da mesma forma, setores com atividades industriais de salários, produtividade e nível tecnológico baixos.
Em síntese, a industrialização e a desindustrialização são fases pelas quais passam todos os países que pretendem se desenvolver, sendo a desindustrialização causada por fatores internos e externos e se dá de três formas especificas. Primeira, por causa do acelerado aumento da produtividade na indústria de transformação que implica numa diminuição relativa do emprego neste setor, mas que é absorvido pelo setor de serviços. A segunda é tratada como um distúrbio, que afeta os países em fase de desenvolvimento, pois os trabalhadores, que perdem seus postos no setor industrial, não serão absorvidos no setor de serviços. E a terceira forma, como explicitado por Rowthorn e Wells (1987), é causada pela mudança na pauta de exportações, que passa de, majoritariamente, constituída por produtos manufaturados, para outra com bens e serviços distintos.
No Brasil, são vários os trabalhos que tentam evidenciar se há desindustrialização ou não no país, destacam-se entre eles os trabalhos de Bonelli (2005), Feijó et al. (2005), Nassif (2008), Bresser e Marconi (2010), Morceiro e Guilhoto (2019) e Maia (2020). Em síntese, os trabalhos se diferenciam nas estratégias metodológicas e, excetuando-se o trabalho de Nassif (2008) para o período de 1990 a 2006, as conclusões indicam a ocorrência de desindustrialização na economia, sendo essa de dinâmica negativa, típica de países em desenvolvimento.
Então, para Nassif (2008) a conclusão é de que não houve desindustrialização de 1990 até 2006, mas que ocorreu, na verdade, uma queda da participação da indústria no PIB, dado a forte contração na produtividade do trabalho devido à estagnação econômica da metade dos anos de 1980, em consonância com as baixas taxas de investimento na economia, que contribuiu para impedir o retorno da participação da indústria no PIB. O autor também mostra que não se confirma a existência de doença holandesa no Brasil. Ao contrário, para Bresser e Marconi (2010) há indícios de que ocorre um processo de desindustrialização brasileiro e que o mesmo é causado pela doença holandesa. Argumentam que o Brasil possui vantagem comparativa em diversas commodities, e por consequência é afetado pela doença holandesa mesmo que não tão acentuada como em países que possuem grandes reservas de petróleo.
Até o começo dos anos 90 no Brasil, havia uma neutralização para a doença holandesa com política de controles tarifários, alfandegários e cambiais, que inibia a receita das exportações de commodities primárias e desestimulava a importação de produtos manufaturados, ocasionando incentivo à produção interna. A desindustrialização se dá por essa falha de mercado, no fato de que houve crescimento menor do PIB da indústria brasileira quando comparado com o crescimento do PIB industrial de outros países em desenvolvimento (Bresser e Marconi, 2010).
Maia (2020) aponta que a desindustrialização brasileira, entre 1998 e 2014, foi motivada pela doença holandesa, a sobrevalorização cambial por longo período e o acirramento da competição internacional em manufaturados, sendo a manutenção, segundo o autor, de uma taxa de câmbio competitiva uma estratégia para retardar o movimento em curso da desindustrialização no Brasil.
No mesmo sentido Feijó et al. (2005) evidenciam que o Brasil, do mesmo modo que parte da América Latina, sofreu um processo de desindustrialização negativa por causa da crise inflacionária da década de 1980 e que foi agravado posteriormente com a abertura econômica e adoção de políticas macroeconômicas como, por exemplo, a sobrevalorização do real. Os autores defendem uma reindustrialização para a volta de taxas de crescimento satisfatórias.
Bonelli (2005) verifica, nas informações fornecidas pelas contas nacionais do Brasil, que as causas da perda do peso relativo da indústria no PIB brasileiro, quando medido a preços correntes, deveram-se ao barateamento relativo dos produtos industriais pós-meados dos anos 1970. Essas mudanças, bem como a introdução do regime de câmbio flexível desde o começo de 1999, alteraram também o relacionamento do Brasil com o exterior. Concluiu que a produtividade da mão de obra industrial mostrou-se pró-cíclica, o que é evidência do efeito Kaldor-Verdoorn na indústria e implica que o ritmo de aumento da produtividade depende do ritmo de aumento da produção.
De acordo com Morceiro e Guilhoto (2019) a desindustrialização do Brasil é natural e esperada para os setores manufatureiros intensivos em trabalho, porém prematura para os setores intensivos em conhecimento e tecnologia, trazendo, assim, consequências negativas para o futuro desenvolvimento científico e tecnológico do país.
Internacionalmente, trabalhos como de Tregenna (2016), Rodrik (2016), Shafaeddin (2005) e Rowthorn e Ramaswamy (1999) ilustram a discussão em ambiente externo com relação à desindustrialização. As conclusões apresentadas são de que políticas adotadas nas décadas de 1980 e 1990 de liberalização econômica em muitos países, especialmente os países em desenvolvimento da América Latina, estimularam uma desindustrialização precoce. Os países alteraram o seu padrão de desenvolvimento e suas instituições de modo a se aproximarem da institucionalidade dos países desenvolvidos e das premissas do Consenso de Washington, estimulando a abertura comercial e impondo uma única meta ao Banco Central, a de estabilidade do nível de preços.
Em complemento, Rowthorn e Ramaswamy (1999) demonstram que a desindustrialização dos países avançados ocorreu principalmente por fatores internos, como a mudança na relação entre a elasticidade-renda da demanda por produtos manufaturados e o de serviços, sendo que os fatores externos, como o comércio norte-sul, possuem pouca relevância para explicar o fenômeno da desindustrialização dos países centrais.
II. MODELO DE CRESCIMENTO KALDOR-VERDOORN
Nicholas Kaldor, economista pós-keynesiano de origem húngara, foi um dos pioneiros a analisar de maneira minuciosa o impacto da industrialização no crescimento econômico com seu trabalho “Causes of the Slow Rate of Economic Growth of the United Kingdom” em 1966, mostrando, de modo geral, que o crescimento econômico ocorre devido à transferência de fatores produtivos de setores com rendimentos decrescentes para setores com rendimentos crescentes, criando economias dinâmicas de escala (Feijó e Carvalho, 2002; Lamonica e Feijó, 2011).
Embora Kaldor (1966) não tenha apresentado sua tese com base em constatações empíricas, Thirlwall (1983) discute um conjunto de argumentos que representam o modelo de Kaldor sobre as diferentes taxas de crescimento das economias avançadas. São três as chamadas “leis de Kaldor” aqui utilizadas, que juntas buscam explicar porque as taxas de crescimento entre os países divergem. A primeira lei de Kaldor, segundo Thirlwall (1983, p. 347) mostra que “existe uma forte relação entre a taxa de crescimento da produção na indústria de transformação e a taxa de crescimento do PIB”, assim sendo, existe uma relação direta entre o grau de industrialização nacional e o crescimento do PIB.
A segunda lei de Kaldor , também conhecida como lei Kaldor-Verdoorn, foi elaborada a partir da contestação de Petrus Johannes Verdoorn em 1993, onde Thirlwall (1983, p. 350) sistematiza que “há uma relação positiva entre a taxa de crescimento da produtividade na indústria e a taxa de crescimento da produção industrial”, devido aos retornos estáticos e dinâmicos de escala. Kaldor (1975) afirma acreditar que existe uma correlação espúria entre a taxa de produtividade e a taxa de crescimento do produto, e que é o crescimento do emprego industrial que gera maior produtividade no setor. Desta forma a segunda lei é uma variante da proposição primeiramente postulada em 1949 por Verdoorn.
A terceira lei afirma que existe forte relação positiva entre o crescimento do produto no setor manufatureiro e o aumento da produtividade total da economia. Isto se dá porque, quanto mais rápida a taxa de crescimento da produção deste setor, maior é a transferência de trabalhadores dos setores da economia que têm rendimentos decrescentes, ou nos quais não existe uma relação entre o crescimento do emprego e o crescimento da produção. Devido aos rendimentos crescentes do setor manufatureiro e o crescimento induzido pela produtividade nos demais setores da economia, quanto mais rápida a taxa de crescimento da produção industrial, mais rápida a taxa de crescimento da produtividade na economia como um todo. De outra forma, essa terceira lei indica que há uma relação negativa entre o crescimento da produtividade do trabalho na economia como um todo e a taxa de crescimento do emprego no setor não manufatureiro, já que a maioria dessas atividades está sujeita a retornos decrescentes. (Thirlwall, 1983; Wells e Thirlwall, 2003).
Uma série de pesquisas foram elaborados com base nessa metodologia, para o Brasil. Braga e Marquetti (2007) analisaram a aplicabilidade das leis para o estado do Rio Grande do Sul, entre o período de 1980 a 2000. Os autores encontram evidências da validade das proposições de Kaldor no contexto regional de uma economia em desenvolvimento e evidenciam a relevância de fomentar a produção industrial nas regiões de menor renda, para promover seu crescimento econômico. Na mesma linha, Turolla e Almeida (2017) aplicam as hipóteses para o estado de Minas Gerais e Duarte (2016) para o estado da Bahia.
Souza (2009) utiliza-se das leis para estudar o processo de desindustrialização no Reino Unido, Estados Unidos e Brasil no período de 1980 até 2008. O autor chega à conclusão de que no Brasil, as primeiras leis de Kaldor apresentam capacidade de explicação, em que a perda de participação do emprego industrial no emprego total se deve à industrialização induzida pelo Programa de Substituição de Importações (conjuntamente com a redução do investimento público no setor) e à abertura comercial, porém, as exportações industriais não afetariam a produtividade total da economia.
Lamonica e Feijó (2011) utilizam-se das leis de Kaldor para avaliar a relação entre o crescimento e industrialização no Brasil no período de 1967 a 2006. Os autores concluíram que um crescimento econômico sustentável irá depender, em economias abertas, de uma demanda agregada dinâmica, onde a industrialização é de grande importância para que as economias se desenvolvam. As leis de Kaldor apresentaram-se válidas e possuem capacidade de explicação para a performance econômica brasileira no período.
Carcanholo e Porsse (2016) avaliam empiricamente as três primeiras leis para os municípios brasileiros utilizando modelos de regressão geograficamente ponderados. Os autores inferem que as Leis de Kaldor são válidas tanto a nível local quanto global e que é necessário considerar efeitos espaciais na análise, já que a indústria apresenta um forte dinamismo econômico, mas o coeficiente de Verdoorn demonstrou uma variação geográfica.
Brutscher (2019) busca analisar o impacto do desempenho da indústria de transformação no desempenho dos demais setores da economia, assim como os impactos gerados na transferência de mão-de-obra entre os setores econômicos do Brasil. A autora conclui que as leis de Kaldor foram válidas no comparativo entre os anos de 2007 e 2016. Quanto à primeira lei, evidencia que a taxa de crescimento da indústria de transformação apresentou uma influência positiva na taxa de crescimento dos demais setores da economia nacional. A lei de Kaldor- Verdoorn foi válida para ambas as especificações, em que a taxa de crescimento do produto industrial apresentou maior impacto na taxa de crescimento da produtividade industrial do que na taxa de crescimento do emprego. Com relação à Terceira lei, enfatiza-se que a taxa de crescimento da produtividade dos demais setores apresentou uma relação negativa com a taxa de crescimento do emprego não industrial e positiva com a taxa de crescimento do produto industrial, validando a proposição de Kaldor.
No mesmo sentido trabalhos internacionais consideram as leis de Kaldor-Verdoorn para analisar e buscar evidências do processo de crescimento econômico, sobre a importância da indústria e dos retornos crescentes de escala. Por exemplo, Wells e Thirlwall (2003) para o continente africano, Alexiades e Tsagdis (2006) para a regiões da Grécia, Dasgupta e Singh (2007) para países em desenvolvimento, Pons-Novell e Viladecans-Marsal (1999) para a Europa.
Wells e Thirlwall (2003), testando as três primeiras leis de crescimento de Kaldor, chegam à conclusão de que há suporte empírico para as mesmas com relação ao continente africano. O artigo evidencia que o crescimento do PIB é mais associado ao crescimento do setor manufatureiro/industrial do que com os setores agrícola ou de serviços. A mudança estrutural em favor das atividades industriais nos locais, de acordo com os autores, ajudaria a acelerar o crescimento econômico e a melhorar os padrões de vida na África.
Alexiades e Tsagdis (2006), estimam efeitos de dependência espacial nas estimações da segunda lei de Kaldor-Verdoorn, em que implica que o processo de crescimento é cumulativo com as economias "avançadas de manufatura" crescendo às custas de suas contrapartes "menos avançadas". No caso da região grega, os resultados indicam que a lei se aplica e os modelos espaciais (o de erro espacial, em particular) têm um desempenho melhor do que os convencionais. Os resultados mostram que, no longo prazo, o processo de “causalidade cumulativa” pode e deve desacelerar em favor das regiões menos avançadas.
Dasgupta e Singh (2007) afirmam que desindustrialização nos países em desenvolvimento de renda média tem todas as características de um tipo patológica, uma vez que as perspectivas de longo prazo para a criação de um setor manufatureiro ou de serviços moderno pioraram.
Já, Pons-Novell e Viladecans-Marsal (1999), indicam que a segunda (no qual há uma forte relação positiva entre o crescimento da produtividade da manufatura e o crescimento da produção da manufatura) e a terceira lei de Kaldor (em que o crescimento da produtividade geral está positivamente relacionado ao crescimento da produção industrial e negativamente ao emprego em setores não-manufatureiros) são compatíveis com o crescimento econômico das regiões europeias durante o período 1984 a 1992. Ainda que a primeira constatação de Kaldor, a de que a manufatura é o motor do crescimento econômico não se mostrou significativa nos dados utilizados para as regiões da Europa no período analisado.
III. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Os dados foram extraídos da base de dados do Sistema IBGE de Recuperação Automática (SIDRA) elaborada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e tiveram como horizonte de tempo os quatro trimestres de 2012 à 2020. As informações utilizadas para a elaboração das variáveis que envolvem o emprego se referiram à variável “Pessoas de 14 anos ou mais de idade, ocupadas na semana de referência, por grupamento de atividades no trabalho principal”, fornecida por meio da Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios Continua Trimestral (PNADC Trimestral).
Com relação ao produto total da economia, a proxy utilizada referiu-se ao “valor adicionado a preços básicos”, fornecido pelo IBGE por meio da pesquisa das Contas Nacionais Trimestrais, que foram deflacionados, por meio da utilização do deflator implícito disponibilizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), tendo 2012 como ano base. Com relação ao produto da indústria de transformação, a proxy utilizada referiu-se ao “Valor adicionado a preços correntes”, fornecido pelo IBGE por meio da pesquisa das Contas Nacionais Trimestrais, que também foram deflacionados tendo 2012 como ano base. Para elucidar, o que neste artigo é chamado de Indústria, na análise empírica refere-se apenas à Indústria de Transformação.
Os dados originais foram tabulados e modelados para a elaboração das variáveis utilizadas nas regressões, variáveis essas nomeadas como taxa de crescimento: da produtividade total, da produtividade industrial, do produto total, do produto industrial, da mão de obra industrial e da mão de obra dos demais setores. Ressaltando que neste artigo considerou-se para o cálculo da produtividade da mão de obra a razão entre o valor adicionado à preços básicos e a mão de obra empregada.
A estratégia econométrica para investigar o papel do setor industrial no crescimento econômico brasileiro, através das leis de Kaldor-Verdoorn, consiste na aplicação do método dos Mínimos Quadrados Ordinários (MQO). Para verificar se a pandemia ocasionada pela Covid 19 está impactando de alguma forma na dinâmica do setor foram realizadas duas regressões para cada Lei, a primeira engloba o período 1, que equivale ao primeiro trimestre de 2012 até o quarto trimestre de 2019. Já a segunda refere-se ao período 2 e incluiu os quatro trimestres de 2020 ao Período 1.
A primeira lei de Kaldor será representada pela equação 1.
onde Gy corresponde à Taxa de Crescimento da economia, que é representada pela taxa de variação do valor adicionado a preços básicos total entre os trimestres, Git representa a taxa de crescimento da Indústria de Transformação que é encontrada por meio da variação do valor adicionado a preços básicos pelo setor nos trimestres analisados e o termo de erro do modelo.
A Segunda lei de Kaldor, também conhecida como Lei Kaldor-Verdoorn, é apresentada em duas especificações. A primeira, representada pela equação 2, parte da especificação original desenvolvida por Verdoorn (1949).
onde Pit representa a taxa de crescimento da produtividade do trabalho na Indústria de Transformação entre os trimestres, a representa a parte exógena que afeta o crescimento da produtividade e b o coeficiente de Verdoorn, que representa a parte endógena, atrelada aos rendimentos crescentes de escala e à capacidade de absorção de mão de obra e recursos ociosos na economia pela indústria. Quanto mais rápida for a taxa de crescimento da produção na indústria de transformação, mais rápida será a taxa de crescimento da produtividade do trabalho nesse setor (Wells e Thirlwall, 2003).
A segunda especificação, que é a apresentação de Kaldor (1966, 1975) da Lei de Verdoorn, é expressa pela equação 3, que, conforme Wells e Thirlwall (2003), relaciona a taxa de crescimento do emprego com a taxa de crescimento do produto, uma vez que o crescimento do produto é a soma do crescimento da produtividade e do crescimento do emprego.
onde Eit corresponde à taxa de variação do emprego no setor da Indústria de Transformação.
A terceira Lei de Kaldor afirma que a taxa de crescimento da produtividade da economia depende positivamente da taxa de crescimento da indústria de transformação e da taxa de crescimento do emprego neste setor e, assim, depende negativamente da taxa de crescimento do emprego no restante da economia, sendo representada pela equação 4.
onde Py corresponde à taxa de crescimento da produtividade total da economia, ou seja, à variação trimestral da razão entre o valor adicionado total a preços correntes e o pessoal ocupado com mais de 14 anos em todos os setores e corresponde à taxa de crescimento do emprego no restante da economia e é calculada a partir da variação entre os trimestres da diferença entre o pessoal ocupado com mais de 14 anos em todos os setores e o pessoal ocupado no setor da indústria de transformação.
Os dados foram dessazonalizados e testados para estacionariedade por meio do teste de raiz unitária de Dickey-Fuller. A confiabilidade dos resultados encontrados pelas regressões foi verificada por meio dos testes Breusch-Pagan-Godfrey para a presença de heterocedasticidade e o teste de Fator de Inflação de Variância (FIV) para a existência de multicolinearidade.
Assim, depois de realizadas as regressões, as mesmas foram analisadas em conjunto com a análise dos indicadores de produção e emprego para se tentar identificar os efeitos da pandemia no setor.
IV. RESULTADOS E DISCUSSÕES
Dado que há duas alternativas principais para se verificar se uma economia apresenta indícios de desindustrialização, via análise da participação da produção industrial na produção total da economia e da participação do número de postos de trabalho deste setor no emprego total da economia, é importante verificar esses indicadores no período de estudo para se obter alguma evidência dessa mudança estrutural no Brasil e dos impactos iniciais da COVID-19 na dinâmica do setor.
IV.1. Há evidências de desindustrialização no Brasil?
A participação do valor adicionado da indústria de transformação no PIB, conforme os dados do gráfico 1, passou de 12,34% no primeiro trimestre de 2012 para 11,24% no primeiro trimestre de 2019, ou, de uma média anual de 12,55% em 2012 para 11,79% em 2019. Vários autores afirmam que há desindustrialização no Brasil ao identificar quedas nesses indicadores. Maia (2020), por exemplo, identifica, a partir dos dados das Contas Nacionais do IBGE, que a participação da indústria de transformação alcançou o seu maior patamar em 2004, quando atingiu 13,6%, e que de 1998 para 2014 reduziu em 2,6 pontos percentuais. Assim, essas informações são indícios de que o Brasil está em processo de desindustrialização e que se intensificou em 2020. Percebe-se que a pandemia de COVID-19 levou a uma queda abrupta da participação da indústria no PIB. Comparando o primeiro trimestre de 2012 com o mesmo trimestre de 2020, essa queda foi de 1,93 pontos percentuais, passando de 12,34% do PIB para 10,41%, participação não registrada em nenhum período anterior da amostra.
Ao se analisar a participação percentual do emprego na indústria de transformação no emprego total (gráfico 2) os dados indicam que ocorreu forte queda, passando de 13,04% no primeiro trimestre de 2012 para 11,35% no primeiro trimestre de 2019, sugerindo desindustrialização. No entanto, considerando o ano de 2020 na análise desse indicador, não é possível afirmar que esse processo se intensificou no primeiro ano da pandemia, nem o contrário, pois registrou uma taxa anual média de 11,42% em 2019 contra 11,44% em 2020.
De acordo com os dados do IBGE (2021), em valores absolutos, os postos de empregos formais na indústria de transformação foram reduzidos em cerca de 7,5% entre o último trimestre de 2012 e o último trimestre de 2019 e em cerca de 15,6% ao se comparar o mesmo trimestre de 2012 ao trimestre final de 2020, passando de 11.681 mil postos no quarto trimestre de 2012 para 10.802 mil no trimestre de 2019 e 9.852 mil postos no trimestre final de 2020. Em contrapartida, ao considerar os postos de emprego do restante da economia, no período que antecede a pandemia do Covid 19, os postos de emprego cresceram cerca de 7% entre o último trimestre de 2012 e o último trimestre de 2019 e reduziram em cerca de 2,4% ao se considerar o mesmo trimestre de 2012 ao trimestre final de 2020, passando de 78.176 mil empregos em 2012 para 83.750 mil em 2019 e fechando com 76.327 mil postos em 2020. Isto evidência um comportamento oposto entre o emprego na indústria e no restante da economia. Enquanto o emprego na indústria de transformação apresentou tendência declinante, no restante da economia apresentou tendência crescente. Com a pandemia mundial, o número de postos de trabalhos formais apresentou uma trajetória de declínio na economia como um todo, mas o efeito foi mais forte, em aproximadamente seis vezes, na indústria de transformação, sendo também um indício de piora na desindustrialização do país.
O gráfico 3 demonstra a produtividade da economia e da indústria de transformação de 2012 a 2020. Considerou-se como produtividade a razão entre o valor adicionado bruto e a mão de obra formal utilizada. Neste sentido, a produtividade da mão de obra do setor da indústria de transformação é inferior à produtividade da economia agregada de 2012 a 2015, a partir de então, torna-se superior àquela durante o período, exceto no último trimestre de 2019 e nos dois primeiros de 2020, o que reflete a queda do produto deste setor no início da pandemia de Covid-19.
Considerando os dados absolutos verifica-se que a indústria de transformação apresentou aumentos na produtividade de 42,1% entre o quarto trimestre de 2012 e o quarto trimestre de 2019 e de 58,5% quando se compara ao trimestre final de 2020. Assim, o valor adicionado bruto por cada unidade de mão de obra passou de R$ 11.369,75 em 2012 para R$ 16.163,16 em 2019 e R$ 18.018,72 no trimestre final de 2020, em valores constantes. Embora em percentuais menores, essa trajetória de aumento da produtividade da mão de obra também é verificada na comparação do total da economia, aumentando cerca de 35,4% do quarto trimestre de 2012 para o quarto trimestre de 2019 e 53,5% em comparação ao quarto trimestre de 2020, onde o valor adicionado por cada unidade de mão-de-obra passou de R$ 12.037,57 em 2012 para R$ 16.297,34 em 2019 e passando para R$ 18.482,97 no trimestre que encerrou 2020.
IV. 2. Resultados Econométricos
Após a dessazonalização e verificação da estacionariedade dos dados, os mesmos foram analisados econométricamente. Os resultados das regressões (com base na Equação 1) referentes à primeira Lei de Kaldor, que analisa o impacto do crescimento da indústria de transformação no crescimento da economia como um todo, são retratados na Tabela 01.
1º T 2012 – 4º T 2019 | 1º T 2012 – 4º T 2020 | |
Intercepto (Importar imagen) (p-valor) | 1.10098 (0.00001) | 0.79101 (0.00306) |
Git (Importar imagen) (p-valor) | 0.25505 (0.00010) | 0.31316 (0.00000) |
Estatística F (p-valor) | 19.82 (0.00010) | 32.96 (0.00000) |
R² | 0.3978 | 0.4997 |
R² ajustado | 0.3778 | 0.4845 |
Teste Breusch-Pagan-Godfray (p-valor) | 0.71867 (0.3966) | 3.2771 (0.07025) |
Como evidenciado, a primeira Lei de Kaldor, para o Período 1, é representada pela seguinte regressão: . Onde, tanto o intercepto, quanto o parâmetro se apresentaram significativos ao nível de 1%, desta forma, cada aumento de 1% na taxa de crescimento da indústria de transformação (Git) teria gerado um aumento de 0,25% na taxa de crescimento da economia (Gy). Considerando o coeficiente de determinação encontrado na análise (R² ajustado), o setor industrial seria responsável por 37,78% das variações na taxa de crescimento da economia, a estatística F corrobora com esta informação. O teste de Breusch-Pagan-Godfrey demonstra que a regressão não apresenta o problema de heterocedasticidade e, portanto, a variância do modelo é constante.
Já com relação ao período 2, a 1ª Lei é representada da seguinte forma: . Assim, pode-se verificar que, ao nível de significância de 1%, cada aumento de 1% em Git teria gerado um aumento de 0,31% em Gy. Considerando o valor encontrado para o R² ajustado, o crescimento no setor industrial teria sido responsável por 48,45% das variações no crescimento da economia total. A estatística F corrobora com a significância estatística do modelo e o teste de heterocedasticidade demonstra que a variância do modelo é constante. Assim, ao se comparar os dois períodos, pode-se perceber que o crescimento do setor industrial aumentou sua influência na taxa de crescimento da economia, passando de 0,25% no Período 1 para 0,31% no Período 2, demonstrando que o setor da Indústria de Transformação apresentou uma ampliação na sua participação no produto nacional durante a pandemia, parte desse aumento da participação do setor no crescimento do produto nacional agregado pode estar relacionado com a redução da participação do setor de serviços em virtude da grande variedade de serviços não essenciais paralisadas durante a pandemia.
A tabela 02 apresenta os resultados da regressão referente à especificação original de Verdoorn e analisa a relação entre o crescimento da indústria de transformação com a produtividade do setor. Os resultados para a o primeiro período forneceram a seguinte regressão: . Assim, embora o intercepto não tenha se apresentado significante, o coeficiente linear mostrou-se significativo e o aumento de 1% na taxa de crescimento do produto industrial teria gerado um aumento de 0,94% na taxa de crescimento da produtividade do setor, indicando retornos crescentes elevados. O R² ajustado demonstrou uma relação forte entre as variáveis, assim, Git estaria determinando 79,41% do comportamento de Pit. A estatística F demonstrou a significância dos dados e o teste de heterocedasticidade demonstrou a constância na variância do modelo.
1º T 2012 – 4º T 2019 | 1º T 2012 – 4º T 2020 | |
Intercepto (Importar imagen) (p-valor) | 0.22237 (0.494) | 0.7941 (0.0921) |
Git (Importar imagen) (p-valor) | 0.94091 (0.00000) | 0.8401 (0.00000) |
Estatística F (p-valor) | 120.6 (0.00000) | 69.34 (0.00000) |
R² | 0.8008 | 0.6775 |
R² ajustado | 0.7941 | 0.6678 |
Teste Breusch-Pagan-Godfray (p-valor) | 0.22917 (0.6321) | 2.0294 (0.1543) |
Já para o período 2, a especificação de Verdoorn pode ser representada como: . Desta maneira, ao nível se significância de 1%, não se pode verificar a significância do intercepto (ou coeficiente angular), em contrapartida, o coeficiente linear apresentou-se significante, e assim, um aumento de 1% em Git teria levado a um aumento de 0,84% na Pit. O coeficiente de determinação apresentou-se alto, explicando 66,78% das variações no crescimento da produtividade da indústria de transformação. A estatística F reafirmou a significância do modelo e o teste de heterocedasticidade garantiu que a variância do modelo foi constante.
Comparando a lei de Verdoorn entre os dois períodos pode se inferir que a pandemia de Covid-19 contribuiu para uma queda na relação entre o crescimento da indústria de transformação e a sua produtividade. De outra forma, isto significa que a indústria perdeu dinamismo, já que o grau de retornos crescentes diminuiu e assim, a absorção de recursos e mão-de-obra ociosa em outros setores não ocorreu por parte do setor industrial.
1º T 2012 – 4º T 2019 | 1º T 2012 – 4º T 2020 | |
Intercepto (Importar imagen) (p-valor) | -0.23133 (0.467) | -0.75463 (0.0847) |
Git (Importar imagen (p-valor) | 0.04951 (0.559) | 0.14417 (0.1330) |
Estatística F (p-valor) | 0.3483 (0.5595) | 2.373 (0.133) |
R² | 0.01148 | 0.06709 |
R² ajustado | -0.02147 | 0.03882 |
Teste Breusch-Pagan-Godfray (p-valor) | 0.071501 (0.7892) | 2.1306 (0.1444) |
Como ilustrado na tabela 03, a regressão da especificação de Kaldor para a Segunda Lei, nos fornece o seguinte resultado para o Período 1: . Porém, a especificação de Kaldor para a Lei não é válida, não sendo possível considerar a taxa de crescimento do produto industrial como determinante do emprego e por consequência da produtividade. O mesmo ocorreu para o Período 2, onde os resultados encontrados podem ser expressos por: . Desta forma, mesmo tendo apresentado a relação esperada pelas variáveis, verifica-se que a segunda Lei de Kaldor, para o impacto do crescimento do Produto no crescimento da Emprego industrial, não foi válida em nenhum dos períodos.
No que tange à terceira lei de Kaldor, a equação 4, que analisa a influência da taxa de crescimento do produto industrial (Git ) e da taxa de crescimento do emprego nos demais setores () no crescimento da produtividade total da economia (Py), os resultados das regressões são ilustrados na tabela 04.
1º T 2012 – 4º T 2019 | 1º T 2012 – 4º T 2020 | |
Intercepto (Importar imagen) (p-valor) | 0.98200 (0.00023) | 0.98029 (0.00002) |
Git (Importar imagen) (p-valor) | 0.23320 (0.00041) | 0.26029 (0.00000) |
Ere (Importar imagen) (p-valor) | -0.36225 (0.33868) | -0.58387 (0.00000) |
Estatística F (p-valor) | 7.974 (0.00174) | 25.57 (0.00000) |
R² | 0.3548 | 0.6151 |
R² ajustado | 0.3103 | 0.5911 |
Teste Breusch-Pagan-Godfray (p-valor) | 3.1837 (0.2035) | 2.4359 (0.2958) |
Teste VIF (Git e Ere) | 1.045337 1.045337 | 1.061996 1.061996 |
Conforme tabela 04, os resultados encontrados para o período 1 podem ser expressos da seguinte forma: . É possível perceber que, o parâmetro relacionado à taxa de crescimento do emprego no restante da economia, mesmo tendo apresentado a relação esperada pela terceira Lei, não demonstrou significância estatística. Desse modo, apesar do modelo não ter apresentado correlação entre as variáveis independentes (teste FIV) e nem o problema de heterocedasticidade e ter representado 31,03% da determinação da produtividade da economia, não se pode tomar como válida a terceira lei para o período 1.
Para o período 2 os resultados encontrados podem ser expressos por: . Em que ao nível de significância de 1%, o modelo apresentou-se significativo, desta forma, um aumento de 1% no crescimento do produto industrial levará a um aumento de 0,26% no crescimento da produtividade total da economia, enquanto está será reduzida em 0,58% com um aumento de 1% na taxa de crescimento do emprego nos demais setores. Esses resultados corroboram com a proposição de Kaldor no qual, o crescimento da produtividade total será diretamente relacionado com o crescimento do produto industrial e se relacionará de forma inversa com o crescimento do emprego no restante da economia. O R² ajustado encontrado para a regressão demonstrou que as variáveis independentes correspondem a 59,11% da determinação do comportamento do crescimento da produtividade da economia. A estatística F e os testes FIV e Breusch-Pagan-Godfrey demonstram a significância dos resultados encontrados.
Os resultados das regressões para as leis de Kaldor podem ser resumidos da seguinte forma: a) a primeira lei é válida para os períodos 1 e 2; b) a lei de Kaldor-Verdoorn não pode ser confirmada, pois é significante apenas para a sua forma original (versão de Verdoorn); c) a terceira lei apresentou validade apenas para o período 2, que engloba o horizonte de tempo total da pesquisa e, portanto, o período da pandemia da Covid-19.
A primeira lei destaca a importância do setor industrial no crescimento da economia brasileira, os períodos analisados neste estudo demonstram que o setor industrial segue importante para a dinâmica nacional, ampliando sua participação no período 2, embora tendo apresentado pouco poder explicativo. A terceira lei, que se apresentou significativa para o período 2 da análise, evidencia que a produtividade total da economia está diretamente relacionada com o crescimento do produto do setor da indústria de transformação e inversamente relacionada com o aumento do pessoal ocupado no restante da economia. Isso seria indício de que a mão de obra seria absorvida pelo setor da indústria de transformação, porém, não se pode afirmar isso, visto que a especificação de Kaldor para a lei de Verdoorn – que analisa a influência do emprego industrial na produtividade deste setor – não pôde ser comprovada, assim como em Souza (2009), e, como destacado por Braga e Marquetti (2007). ,
Embora não tenha sido possível validar todas as Leis para os períodos considerados, assim como em Pons-Novell e Viladecans-Marsal (1999), Souza (2009) e Lamonica e Feijó (2011), ainda pode-se inferir que o setor industrial possui uma importância positiva para a dinâmica nacional.
V. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O objetivo deste artigo foi verificar se há evidências de intensificação do processo de desindustrialização no Brasil, dado o período recente mundial caracterizado como pandemia da COVID-19, bem como, investigar o papel da indústria de transformação no crescimento econômico via leis de Kaldor.
Primeiramente, utilizando os dados da PNADC e IBGE, entre 2000 e 2020, foram analisados os indicadores da participação da produção da indústria de transformaçãoustrial na produção total da economia e da participação do número de postos de trabalho deste setor no emprego total da economia. Os resultados indicam que a economia brasileira encontra-se em processo de desindustrialização e que há indícios de intensificação do mesmo durante a pandemia da COVID-19, pois a participação da indústria no PIB caiu 1,93 pontos percentuais entre 2012 e 2020 e a participação do emprego deste setor no emprego total da economia passou de 13,04% em 2012 para 11,44 em 2020. Sendo que, com a pandemia mundial, o declínio no número de postos de trabalhos formais foi mais forte, em aproximadamente seis vezes, na indústria de transformação do que na na economia como um todo. Neste sentido, Tregenna (2016) destaca que uma importante questão política e social é a perda de empregos na indústria e a aparente incapacidade dos demais setores da economia de absorver aqueles que perderam seus empregos, além disso, como o setor industrial é um importante gerador de empregos de alta e média qualificação, a desindustrialização pode, portanto, conduzir um aumento da pobreza e da desigualdade de renda.
O papel da indústria de transformação na economia brasileira foi averiguado através das “leis de Kaldor”. Os resultados das regressões indicam suporte para a primeira e a terceira lei. Especificamente, a primeira lei indica que o crescimento do setor industrial está positivamente associado à taxa de crescimento da economia e que esse papel tornou-se mais evidente durante a pandemia, ou seja, em um contexto de queda do nível geral de atividade econômica. A terceira lei de Kaldor, que indica que um aumento na produtividade da economia é relacionado com uma queda no emprego dos demais setores, apresentou validade apenas para o segundo período da análise, que engloba o horizonte de tempo total da pesquisa e, portanto, o período da pandemia de Covid-19.
Finalmente, é possível afirmar que há indícios de que o processo de desindustrialização no Brasil se intensificou durante a pandemia de Covid-19 e que, dada a importância do setor na dinâmica econômica nacional, faz se necessário a adoção de estratégias, sejam elas elas públicas ou privadas, que foquem na reversão desse processo e que, possibilite, dessa forma, maiores taxas de crescimento econômico. Adicionalmente, há alguns elementos que não foram explorados neste artigo e que poderão ser abordados em pesquisas futuras, como os efeitos políticos e sociais da desindustrialização.
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