Além da revolução keynesiana: um estudo
comparativo das escolas de pensamento econômico
após keynes
Beyond the keynesian revolution: a comparative study
of economic thought schools after keynes
Data de recepção: 14 de julho de 2024
Data de aprovação: 1 de agosto de 2024
1Doutorado em Economia pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB) - (2021). Mestre em Economia pela (UFRN) - (2014).
Graduado em Economia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) - (2011). Professor na Universidade
Federal Rural do Semi Árido - UFERSA, lotado no Departamento de Engenharias. Tem interesse nas áreas de Economia
Regional, Economia Brasileira, Metodologia Econômica, Economia Internacional, Crescimento Econômico e
Macroeconomia.. Correo electrónico: jose.silva@ufersa. edu.br. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-1514-6999.
1
José Alderir Silva
Resumo
As contribuições de Keynes tiveram um impacto significativo no desenvolvimento
da teoria econômica, gerando diversas correntes de pensamento no mainstream e
na heterodoxia. A síntese neoclássica-keynesiana buscou combinar elementos da
teoria neoclássica com a teoria keynesiana, visando reconciliar os princípios
microeconômicos do modelo clássico com o pensamento de Keynes. A escola
monetarista procurou destacar o papel da oferta de moeda na determinação da
produção, introduzindo conceitos como expectativas adaptativas e taxa natural de
desemprego. Por outro lado, os novos-clássicos se concentraram em expectativas
racionais e na capacidade de os mercados se ajustarem rapidamente por meio da
flexibilidade de preços e salários. Os novos keynesianos incorporaram elementos
das ideias de Keynes às teorias neoclássicas, especialmente no que dizem respeito
à rigidez de preços e imperfeições de mercado. Por fim, a escola pós-keynesiana
se desenvolveu a partir das teorias propostas por Keynes, buscando se distanciar
tanto das interpretações mais convencionais como da abordagem das escolas
anteriores. Dessa forma, o objetivo deste artigo é analisar a evolução da teoria
econômica dessas cinco escolas do pensamento econômico pós-Keynes,
destacando suas semelhanças e diferenças.
Palavras-chave: ntese neoclássica, pós-keynesianos, novos-clássicos,
monetaristas, novos-keynesianos.
Abstract
Keynes' contributions had a significant impact on the development of economic
theory, generating several schools of thought in both mainstream and heterodoxy.
The neoclassical-Keynesian synthesis sought to combine elements of neoclassical
theory with Keynesian theory, aiming to reconcile the microeconomic principles of
the classical model with Keynes's thinking. The monetarist school aimed to
emphasize the role of the money supply in determining production, introducing
concepts such as adaptive expectations and the natural rate of unemployment.
Conversely, the new classical economists focused on rational expectations and the
ability of markets to adjust rapidly through the flexibility of prices and wages. New
Keynesians incorporated Keynesian ideas into neoclassical theories, particularly
regarding price rigidity and market imperfections. Finally, the post-Keynesian school
evolved from Keynes's theories, seeking to distance itself from both conventional
interpretations and the approaches of earlier schools. Thus, the goal of this article is
to analyze the evolution of economic theory within these five post-Keynesian schools
of economic thought, highlighting their similarities and differences.
Keywords: neoclassical synthesis, post-Keynesians, new-classical, monetarists,
new-Keynesians.
1. Introdução
A escola neoclássica foi a vertente hegemônica do pensamento econômico
até a crise nos anos 1930. Essa escola, até a publicação da Teoria Geral por
Keynes, prescrevia um conjunto de políticas econômicas consideradas como ideais
para o bom funcionamento da economia.
O governo deveria buscar o equilíbrio do orçamento permanentemente, uma
vez que déficits públicos seriam indesejáveis porque aumentariam a taxa de juros e
não teriam efeito permanente sobre os veis de produção e emprego da economia.
Portanto, adotava-se o princípio das finanças sadias
1
.
A intervenção do estado na economia devia ser restringida aos casos de
falhas de mercado, como bens públicos, externalidades, informações assimétricas
e proteção da concorrência. Nos demais casos, o livre mercado sempre seria mais
eficiente que o governo para reestabelecer o equilíbrio da economia (Haj-Omar,
2001).
A validade da lei de Say, ou seja, de que poupança gera investimento,
suportaria a ideia de que quanto maior a poupança dos agentes econômicos, mais
se causaria a redução da taxa de juros e se incentivariam os investimentos privados
e, portanto, a acumulação de capital e o crescimento econômico
2
.
Não obstante, para a economia funcionar de acordo com esses princípios,
deveriam aceitar a validade de pelo menos duas hiteses: i) a existência da plena
flexibilidade de preços e salários que garantiria o equilíbrio com pleno emprego da
economia; ii) a validade da teoria quantitativa da moeda, ou seja, a neutralidade da
moeda cuja quantidade não afeta variáveis reais, como produção e emprego. Mas
tendo efeito permanente apenas sobre os preços e outras variáveis nominais.
No entanto, todo esse arcabouço de teorias econômicas fracassou em
explicar os eventos que se seguiram à crise de 1929, pois o levou em
consideração a possibilidade de desemprego involuntário e subutilização da
capacidade produtiva. Por contraste, em 1936, Keynes publicou a Teoria Geral do
1
Vide Colander (2006) sobre o princípio das finanças sadias.
2
Vide Damico (1985) para uma maior análise da Lei de Say e Carvalho e Carvalho (2018),
encontram-se as críticas de Keynes a essa lei.
Emprego, do Juro e da Moeda”, um livro que revolucionaria a teoria econômica
rompendo com o programa de pesquisa anterior.
Na Teoria Geral, Keynes apresenta um conceito capaz de explicar as
ramificações da Grande Recessão: o princípio da demanda efetiva. Enquanto na
teoria clássica a oferta agregada é igual à demanda agregada, implicando que todo
equilíbrio é um equilíbrio de pleno emprego, e, portanto, não desemprego
involuntário, Keynes argumenta que o equilíbrio com pleno emprego é uma
possibilidade remota. Ele destaca a propensão à insuficiência de demanda efetiva
tornando provável a existência de desemprego involuntário (Amadeo, 1989).
Dessa forma, Keynes aceita a premissa da teoria clássica de que o salário é
equivalente ao produto marginal do trabalho, mas rejeita a segunda premissa
3
, pois
ela não é compatível com a possibilidade de desemprego involuntário. O nível de
emprego é determinado exclusivamente pelo lado da firma, levando em
consideração suas expectativas em relação à oferta e à demanda agregadas na
economia. Em outras palavras, Keynes define a oferta e a demanda agregadas em
termos de expectativas resultantes da antecipação de um produto para o qual as
empresas contratam uma quantidade espefica de trabalho com a expectativa de
gerar receita.
Segundo Carvalho (2006), o mercado monetário de Keynes difere do
mercado neoclássico. Neste, a moeda é considerada apenas um meio de troca em
um contexto de um sistema bancário rudimentar sem influenciar as decies dos
agentes, sendo, portanto, chamada de neutra na teoria clássica.
3
Essa premissa estipula que a utilidade do salário é equivalente à desutilidade marginal de um
determinado nível de emprego.
Portanto, Silva (2022) mostra que, ao contrário do programa clássico, a
análise de Keynes ocorre em uma economia monetária na qual a moeda não é
neutra, mas sim um instrumento que afeta os gastos dos agentes econômicos,
tendo impacto no produto e no emprego da economia. Assim, Keynes propõe uma
ruptura com o paradigma clássico, sugerindo a substituição desse modelo por uma
abordagem mais realista caracterizada por uma economia monetária.
Consequentemente, Keynes elimina a dicotomia entre o setor real e o setor
monetário da economia
4
. a taxa de juros desempenharia um papel crucial na
compreensão do princípio da demanda efetiva, marcando o ponto em que Keynes
se distancia do programa clássico. Na visão clássica, havia a crença na existência
de forças que atraíam a taxa de juros real para uma única taxa de juros natural de
equilíbrio a longo prazo. Em contraste, na abordagem de Keynes, a taxa de juros
natural de equilíbrio a longo prazo não é única e passa a ser determinada pelo
mercado ou pela taxa de juros nominal permitindo a existência de vários equilíbrios
de longo prazo.
Dessa maneira, Keynes inverte a relação causal entre a taxa de juros e a
eficiência marginal do capital. Na perspectiva keynesiana, a taxa de juros passa a
determinar a eficiência marginal do capital destacando a importância da moeda.
Esta última se torna uma das variáveis que influenciam a taxa de juros,
representando a preferência pela liquidez sob a ótica keynesiana. Nessa
abordagem, a taxa de juros é considerada um fenômeno monetário, enquanto a
4
Vide Silva (2017) para uma análise da revolução keynesiana na economia.
moeda é um fenômeno real, exercendo impactos na economia tanto no curto quanto
no longo prazo (Silva, 2022).
Além da taxa de juros, as expectativas dos agentes em relação ao retorno de
seu capital o determinantes para a eficiência marginal do capital. Nesse contexto,
a incerteza surge como uma variável capaz de abalar as expectativas dos
empresários, estando amplamente presente na economia monetária de Keynes.
Assim, o cálculo racional, que era um pressuposto no programa anterior, perde sua
relevância
5
.
Essas expectativas possibilitam que os agentes econômicos conectem o
presente ao futuro e, dado que a produção é intertemporal, tais expectativas
influenciam o nível de investimento e, por conseguinte, o emprego em uma
economia de mercado. O grau de confiança é condicionado pela observação
empírica dos mercados e pela psicologia empresarial.
Diante dessas incertezas os investidores podem se recusar a fazer
investimentos em veis para garantir o pleno emprego, o que pode provocar uma
queda da demanda agregada e do emprego, aumentando as incertezas na
economia. Para Keynes, uma das maneiras de estabilizar a economia e garantir o
pleno emprego seria através da socialização dos investimentos. Isso não significa
a estatização completa de todos os investimentos privados, mas sim um maior papel
do Estado na condução do investimento. Ele acreditava que, em certas
circunstâncias, o governo deveria intervir na economia para estimular a demanda
5
Em Carvalho (2014), se encontra um estudo sobre a questão da incerteza e das expectativas.
agregada e garantir veis adequados de investimento, especialmente em
momentos de recessão ou depressão.
No contexto do mercado keynesiano de bens, Lima e Sicsú (2003) mostram
que Keynes se afasta do critério clássico de maximização da satisfação ou utilidade
diante de uma restrição orçamentária. Em vez disso, ele passa a avaliar o consumo
em termos agregados. A relação entre o consumo e a renda é expressa pela
propensão marginal a consumir, que representa a parte da renda que os agentes
econômicos planejam destinar ao consumo.
No entanto, um aumento nos investimentos tem o potencial de elevar a renda
agregada em uma proporção maior do que o valor inicialmente investido, graças ao
que Keynes identificou como o efeito multiplicador dos gastos.
Keynes também descarta a ideia de flexibilidade de preços e salários, que
era considerada um mecanismo para assegurar o pleno emprego no programa
predominante. Na sua visão, o existe nenhum mecanismo intnseco que
assegure que um equilíbrio de demanda efetiva seja simultaneamente um equilíbrio
de pleno emprego.
Pereira (2023) afirma que, na Teoria Geral, a causa da insuficiência de
demanda em uma economia laissez-faire é uma taxa de juros superior à eficiência
marginal do capital, impedindo a realização de investimentos compatíveis com o
pleno emprego. Assim, os ciclos econômicos são uma preocupação para Keynes e
sua análise aborda o apenas os ciclos, mas também um equilíbrio de longo prazo
em que a trajetória de crescimento da economia oscila, apresentando múltiplos
equilíbrios de longo prazo, inclusive o equilíbrio de pleno emprego do programa
clássico.
As contribuições de Keynes tiveram um impacto significativo no
desenvolvimento da teoria econômica, gerando diversas correntes de pensamento
no mainstream e na heterodoxia, ocorrendo uma verdadeira revolução no sentido
de Kuhn (1964). Portanto, o objetivo deste artigo é analisar a evolução da teoria
econômica no mainstream após as críticas de Keynes e a continuidade de suas
teorias pela escola s-keynesiana, destacando as semelhanças e diferenças entre
as linhas do pensamento econômico estudadas.
Para isso, o artigo está dividido em mais seis seções além desta introdução.
Na seção seguinte, encontra-se a reação imediata da corrente neoclássica às ideias
de Keynes. Nas três seções seguintes, se analisa a revolução da ortodoxia
provocada pela perspectiva keynesiana, ou seja, tenta-se resgatar os pressupostos
da teoria neoclássica pré-Keynes. Os s-keynesianos são a última escola
estudada, sendo uma alternativa à ortodoxia dominante e uma continuidade do
desenvolvimento do pensamento keynesiano. Por fim, são feitas as considerações
finais.
2. Síntese neoclássica keynesiana
Nos anos seguintes à publicação da Teoria Geral, os economistas clássicos
passaram a debater a obra de Keynes. Do debate
6
, emergiu a escola neoclássica
keynesiana, que se destaca pela tentativa de reconciliar as principais contribuições
de Keynes com aquelas dos economistas clássicos que o antecederam, os quais
foram criticados por ele em sua obra a Teoria Geral.
6
Vide Hicks (1937), Modigliani (1944), Hansen (1949) e Samuelson (1995).
Assim, segundo Snowdon e Vane (2005), a abordagem keynesiana ortodoxa
colocou lado a lado a macroeconomia keynesiana e a microeconomia neoclássica,
onde as questões de longo prazo encontravam respostas nos modelos
microeconômicos e a macroeconomia “keynesianapassou a ser útil para analisar
os fenômenos agregados de curto prazo
7
. Nascia, assim, conforme Blanchard
(1988), um novo paradigma: a ntese-neoclássica “keynesiana”. Essa ntese
8
procurou incorporar ao menos cinco conclusões da teoria geral de Keynes:
i) De que a economia é intrinsecamente instável e está sujeita a choques.
Tais choques são provenientes, principalmente, das mudanças na
eficiência marginal do capital derivada de uma mudança na confiança dos
empresários. Keynes denominou isso de spirits animals”.
ii) Depois de um choque que leve a economia para abaixo de uma situação
de pleno emprego, o retorno ao equilíbrio não é automático e pode levar
muito tempo para ser alcançado.
iii) Ausência do leiloeiro walrasiano, que se deve à rigidez de preços e
salários, de modo que variações na demanda passam a afetar os níveis
de estoques de produtos. Em outras palavras, a demanda cria sua própria
oferta. Tem-se, aí, a “Lei de Say invertida”.
7
A palavra keynesiana foi colocada entre aspas, uma vez que o reflete o pensamento de Keynes
exposto na Teoria Geral. O mesmo será feito quando se estiver analisando a escola novo-
“keynesiana”.
8
Cujos principais autores são: Paul Samuelson, John Hicks, Alvin Hansen, Franco Modigliani e
James Tobin.
iv) O vel de produção e emprego é determinado pela demanda agregada
e os policymakers podem intervir para determinar o nível de demanda
agregada para assegurar o equilíbrio de pleno emprego.
v) Diante de choques, a utilização da política fiscal é preferida à política
monetária para estabilizar a economia, uma vez que seus efeitos são
mais rápidos e diretos sobre a demanda agregada.
vi) O governo não deve buscar equilibrar o orçamento de forma permanente,
mas a política fiscal deve ser implementada com o objetivo de gerar
demanda agregada na medida correta para que a economia alcance o
pleno emprego sem promover pressões inflacionárias
9
.
Inicialmente, essas conclusões foram incorporadas primeiramente no modelo
neoclássico que tentou fazer uma interpretação da Teoria Geral: o modelo IS-LM,
de Hicks (1937), em seu trabalho Mr. Keynes and the classics, a suggested
interpretation. Posteriormente, esse modelo foi desenvolvido por Modigliani (1944)
e Hansen (1949) e se tornou o principal modelo da teoria macroeconômica, tendo
grande influência na condução da política econômica até meados da década de
1960.
Nessa simplificação das ideias de Keynes, têm-se dois mercados: o de bens
e o monetário. No primeiro mercado, o vel de produção é totalmente determinado
pelo lado da demanda agregada, isto é, as limitações do lado da oferta passam a
ser ignoradas. Em uma economia fechada, a demanda agregada é composta pelo
9
Isto é, defende-se o princípio das finanças funcionais de Lerner (1943).
consumo, pelo investimento e pelos gastos do governo. O consumo é determinado
pela renda disponível, o investimento tem uma relação inversa com a taxa de juros
e os gastos do governo são uma variável exógena.
Da função de demanda agregada se deriva a curva IS, que é desenhada em
um lócus de combinação entre taxa de juros e produto. Em equilíbrio, o investimento
(I) é igual a poupança (S), por isso a denominação de curva IS. Tendo o investimento
uma relação negativa com a taxa de juros, a curva IS é negativamente inclinada,
determinada pela elasticidade-juros do investimento. Assim, a curva IS será mais
plana quanto maior for a resposta do investimento a variações na taxa de juros.
no mercado monetário, a oferta de moeda é uma variável exógena
determinada pelas autoridades monetárias. Em relação à demanda por moeda,
existem três motivos para retê-la: transação, precaução e especulação. A demanda
por moeda pelos motivos de transação e precaução está positivamente relacionada
à renda da economia, enquanto o motivo de especulação tem uma relação negativa
com a taxa de juros.
O mercado monetário estará em equilíbrio quando a demanda (L) por moeda
for igual à oferta (M), de modo que da igualdade entre essas duas funções se deriva
a curva LM. Essa curva é desenhada em lócus de taxa de juros e produto, tendo
inclinação positiva, dada a hipótese de que a demanda por moeda é negativamente
relacionada com a taxa de juros e positivamente com a renda. Essa inclinão
depende da elasticidade-juros da demanda por moeda, sendo mais plana quanto
maior for a sensibilidade dessa demanda em relação a variações na taxa de juros.
Quando ocorre o cruzamento entre as curvas IS e LM, a economia alcança
simultaneamente o equilíbrio no mercado de bens e monetário. Nesse equilíbrio, a
taxa de juros obtida equilibra tanto o mercado de bens quanto o mercado monetário.
Por outro lado, o nível de renda é inferior ao nível de pleno emprego, o que permite
a utilização e concede um papel importante das políticas monetárias e fiscais para
a estabilização da economia.
Todavia, a eficiência das políticas macroeconômicas depende dos
parâmetros estruturais do modelo, ou seja, das inclinações relativas das curvas IS
e LM. Por exemplo, a política fiscal será mais eficaz para levar a economia ao pleno
emprego quanto maior a elasticidade-juros da demanda por moeda (LM mais plana)
e menor a elasticidade-juros do investimento (IS mais vertical)
10
. Por outro lado, a
política monetária será mais eficaz quanto menor fora elasticidade-juros da
demanda por moeda (LM mais vertical) e maior a elasticidade-juros do investimento
(IS mais plana)
11
.
Empiricamente, Segundo Carvalho (1988), estudos econométricos
mostraram que o investimento era pouco sensível a variações na taxa de juros, o
que levava a acreditar que a curva IS era quase vertical. Esse fato empírico tornava
a política monetária ineficaz para expandir a demanda agregada até o pleno
emprego. Além disso, no caso extremo em que a elasticidade-juros da demanda por
moeda tende ao infinito, LM horizontal ou armadilha da liquidez, o mecanismo deixa
de existir e a política monetária se torna totalmente ineficaz para expandir o nível
10
Nesse caso, como o investimento é pouco sensível a variações na taxa de juros, seria necessária
uma taxa de juros nominal negativa para expandir a economia até o nível potencial. No entanto, o
máximo a que a taxa de juros nominal pode cair é a zero, inviabilizando o uso da política monetária.
11
Nesse caso, uma potica fiscal expansionista elevaria a taxa de juros em um nível que cortaria os
gastos privados na mesma proporção da expansão dos gastos pelo governo, ocorrendo o efeito
crowding out total. Como resultado, no longo prazo, a moeda seria neutra e a política fiscal ineficaz.
de renda
12
. Do mesmo modo, quando a elasticidade-juros do investimento é zero, a
curva IS se torna vertical e a política monetária ineficiente.
A conclusão para a maior parte dos autores da síntese-neoclássica
keynesiana era de que a política monetária seria pouco eficaz e pouco confiável,
sendo a política fiscal preferida por ser relativamente mais poderosa para levar a
economia mais próxima a uma situação de pleno emprego.
No modelo IS-LM é perfeitamente possível o mercado de bens e monetário
estarem em equilíbrio abaixo do seu produto potencial e, portanto, o mercado de
trabalho abaixo do pleno emprego. Todavia, no longo prazo, o equilíbrio no mercado
de trabalho é alcançado de modo que não tem desemprego involuntário e a
economia se encontra no seu produto potencial.
Para isso acontecer, o modelo IS-LM foi combinado com a hipótese clássica
de preços e salários flexíveis, de modo que qualquer desequilíbrio no mercado de
trabalho é corrigido automaticamente sem a necessidade de políticas fiscais ou
monetárias. Por exemplo, quando a economia se encontra abaixo do seu produto
potencial, o mercado laboral tem um desequilíbrio caracterizado por um excesso de
oferta de trabalho. No longo prazo, como os preços e salários são perfeitamente
flexíveis, o excesso de oferta laboral resulta em uma queda dos salários nominais,
reduzindo os custos das empresas e, portanto, os preços. Essa redução dos preços
aumenta a oferta real de moeda (deslocamento da LM para baixo), reduzindo a taxa
12
Esse caso é o da armadilha da liquidez, na qual o aumento da oferta de moeda é retido pelos
agentes, uma vez que a baixa taxa de juros correntes nas condições da armadilha por liquidez torna
o rentável emprestar o excesso de moeda. Assim, a expansão monetária o reduz a taxa de
juros, o investimento não aumenta e, consequentemente, a produção e o emprego também não
aumentam.
de juros e, consequentemente, elevando o investimento, a demanda agregada, a
renda real e o emprego
13
. Isso ocorre até que o mercado de trabalho esteja em
equilíbrio
14
, isto é, a economia esteja em pleno emprego e em seu produto efetivo
igual ao produto potencial (Modigliani, 1944).
Observe que a economia alcança o equilíbrio com pleno emprego sem a
utilização de políticas macroeconômicas. No entanto, a ntese neoclássica
argumenta que existem duas limitações que o mecanismo descrito acima de auto-
equilibrar a economia no pleno emprego: armadilha da liquidez e quando a
elasticidade-juros investimento for pequena (Hansen, 1949).
Nesses dois casos, o efeito-Keynes deixa de funcionar como descrito
anteriormente e a demanda agregada não aumenta o suficiente para levar a
economia ao pleno emprego
15
, persistindo situações de desemprego involuntário
que pode ser eliminado através de políticas fiscais expansionistas que aumentem a
demanda agregada. Isso significa dizer que Keynes não conseguiu apresentar uma
teoria geral, uma vez que a possibilidade de equilíbrio com desemprego involuntário
ocorre apenas nesses dois casos especiais.
No entanto, ainda faltava uma explicação sobre a inflação na teoria
macroeconômica da síntese-neoclássica keynesiana. No final dos anos 1950, Alban
13
Esse efeito indireto via redução de salários e preços foi denominado de efeito-Keynes.
14
Salário real em equibrio (dado que a queda dos salários é maior do que a dos preços) e sem
desemprego involuntário.
15
No caso da armadilha por liquidez, o efeito-Keynes o provoca a queda da taxa de juros devido
aos agentes econômicos manterem o aumento do saldo da oferta real por moeda ociosa sem
emprestar, evitando a queda da taxa de juros que seria necessária para estimular a demanda
agregada e restaurar o pleno emprego. Sem esse aumento da demanda para moderar o ritmo da
queda dos pros, estes caem proporcionalmente à queda dos salários nominais. Com efeito, o
salário real permanece acima do de equilíbrio, persistindo uma situação de desemprego involuntário.
No caso de baixa elasticidade-juros do investimento, a queda da taxa de juros é insuficiente para
restaurar o pleno emprego. Esta teria que ser negativa para levar a economia ao equilíbrio, mas,
como visto anteriormente, a taxa de juros nominal não pode ser menor que zero.
William Phillips publica um artigo sugerindo uma interação inversa entre a taxa de
inflação e a taxa de desemprego em uma economia. A ideia central de Phillips
(1958) é que existe um trade-off permanente entre desemprego e taxa de salários
e, portanto, a inflação no longo prazo.
Durante os anos 1960, a curva de Phillips foi rapidamente inserida como
parte do paradigma da síntese-neoclássica keynesiana, passando a utilizá-la para
prever a inflação que resultaria dos diferentes veis de desemprego alcançados
pela política macroeconômica ativa, principalmente, a fiscal.
Não obstante, em meados dos anos 1970, tanto a inflação quanto o
desemprego começaram a aumentar, levando a contestação dessa relação estável
entre inflação e desemprego por economistas da chamada escola monetarista.
Friedman (1968) e Phelps (1967) negaram a existência do trade-off permanente
defendido pela ntese-neoclássica keynesiana, conforme sedescrito na próxima
seção.
3. Os monetaristas
Os monetaristas
16
procuram elucidar a conexão entre a moeda e os níveis
de preços e produção, emergindo como críticos proeminentes da abordagem
keynesiana. Segundo Cagan (1988), a base da teoria monetarista repousa na
concepção de que a moeda desempenha um papel crucial na macroeconomia,
influenciando tanto os veis de produção e emprego a curto prazo quanto
16
Os principais representantes dessa corrente do pensamento econômico são: Milton Friedman,
Anna Schwatrtz, David Laidler, Karl Brunner e Allan Meltzer.
provocando alterações nos níveis de preços a longo prazo através do controle do
estoque monetário.
Dessa forma, os monetaristas sustentam a crença na neutralidade da moeda
a longo prazo, indicando que alterações na oferta monetária impactam
exclusivamente variáveis nominais (preços, salários etc.) e não exercem efeito
sobre variáveis reais (produção, emprego etc.). A neutralidade da moeda tem a ver
com que, em última instância, mudanças na oferta monetária afetam apenas o nível
de preços sem influenciar o produto real ou o emprego.
Os monetaristas sustentam que as variações na oferta de moeda têm efeitos
diretos e previveis sobre o nível de preços e, portanto, sobre a inflação. A TQM,
com sua equação fundamental MV = PY é central para a argumentação monetarista.
Em sua versão, a teoria assume que a velocidade da moeda (V) é relativamente
estável no curto e médio prazo e que o produto real da economia (Y) cresce a uma
taxa constante determinada por fatores de oferta, como tecnologia e crescimento
populacional. Assim, qualquer aumento na quantidade de moeda (M) tende a
resultar em um aumento proporcional no vel de preços. Segundo Friedman,
quando o crescimento da oferta monetária excede o crescimento do produto real da
economia, a diferença se manifesta como inflação.
A análise de Friedman se concentra em dois pontos essenciais: i) Quais são
as restrições da política monetária? ii) Como as autoridades monetárias devem
orientar a condução da política monetária?
A resposta à primeira questão está associada à hipótese friedmaniana da
taxa natural de desemprego, ou seja, o patamar no qual o sistema walrasiano de
equações de equilíbrio geral estaria sustentado. Na visão dos monetaristas, a taxa
natural de desemprego representa o vel de desemprego que prevaleceria na
economia a longo prazo quando os mercados de trabalho estão em equilíbrio e não
sujeitos a distorções temporárias. As políticas que visam manter persistentemente
o desemprego abaixo desse vel são consideradas potencialmente geradoras de
inflação a longo prazo, conforme a perspectiva monetarista.
Em relação à segunda indagação, Friedman (1968) argumenta que o trade-
off constante entre inflação e desemprego não se mantém a longo prazo devido à
intervenção dos formuladores de políticas no mercado. Em outras palavras,
Friedman questiona a validade da curva de Phillips original e propõe uma versão
modificada, na qual são introduzidas as regras de formação de expectativas do
público em relação ao comportamento da inflação.
O modelo monetarista incorpora as expectativas adaptativas à curva de
Phillips, na qual se afirma que a estimativa ideal para o nível futuro de preços é
baseada no próprio histórico observado dos preços
17
. Expectativas adaptativas
envolvem a concepção de que as expectativas dos agentes econômicos o
moldadas por informações anteriores e ajustes graduais ao longo do tempo. Nesse
enfoque, os agentes econômicos presumem que as condições futuras seguirão
padrões semelhantes aos observados no passado recente.
Dessa forma, Friedman (1970) conclui que as variações nas taxas de
crescimento decorrem da incapacidade de os agentes econômicos preverem a
inflação futura. Entretanto, ao longo do tempo, por meio de um processo contínuo
17
De maneira simples, a equação πet = πt-1 representa a forma como as expectativas são elaboradas
no modelo monetarista, em que πet é a inflação esperada no período t e πt-1 é a inflação do período
anterior (ou uma média ponderada de todos os pros ocorridos no passado, sendo maior o peso
quanto mais próximo for o peodo de t).
de revisão das expectativas, a inflação esperada pelos agentes econômicos tende
a se alinhar à inflação corrente. Como resultado dessa antecipação inflacionária, o
vel de emprego retorna à sua taxa natural de desemprego.
Na visão monetarista, a política monetária tem o potencial de moldar as
expectativas das pessoas quanto à inflação. Por exemplo, a adoção de medidas
inesperadas pelo banco central, como uma expansão ou contração surpreendente
da oferta de moeda, pode impactar as expectativas inflacionárias dos agentes
econômicos (Meltzer, 2010).
Contudo, de acordo com Brunner (1968), os agentes respondem e ajustam
gradualmente suas expectativas ao longo do tempo. Eles não reagem
instantaneamente a novas informações, mas adaptam suas expectativas com base
em experiências passadas. Isso sugere que, mesmo diante de mudanças na política
econômica, as expectativas podem levar algum tempo para se ajustarem
completamente.
Consequentemente, o desfecho final da expansão monetária ou de qualquer
política econômica será apenas o de perturbações nas variáveis nominais da
economia. O trade-off temporário entre desemprego e inflação surge apenas de
inflação não antecipada e tende a ser corrigido pelos agentes econômicos ao longo
do tempo, de modo que, a longo prazo, o trade-off desaparece.
À medida que os trabalhadores ajustam seus salários nominais com base na
inflação passada, uma política monetária expansionista, ao elevar a inflação atual
acima das expectativas (do ano anterior), reduz os salários reais abaixo do equilíbrio
sem que seja prontamente percebido pelos trabalhadores, sujeitando-os a uma
ilusão monetária a curto prazo. Contudo, com o passar do tempo, os trabalhadores
percebem a discrepância e começam a ajustar seus salários nominais, resultando,
a longo prazo, em um salário real equivalente ao de equilíbrio (Friedman, 1968).
Para manter a economia em uma trajetória estável, segundo Bordo e
Schwatz (1987) e Friedman (1990), as autoridades monetárias devem adotar uma
política monetária caracterizada por uma taxa constante de crescimento na oferta
de moeda. Isso visa prevenir que a moeda, por si , se torne a principal fonte de
perturbação na economia. Os monetaristas afirmam que o gerenciamento da oferta
de moeda é fundamental para a estabilidade econômica. Sustentam que políticas
monetárias coesas e previsíveis são indispensáveis para evitar oscilações
excessivas na atividade econômica e na taxa de inflação.
Além disso, os monetaristas mantêm um ceticismo em relação à eficácia da
política fiscal, que envolve a manipulação do gasto público e dos impostos, como
meio para estabilizar a economia. Tanto Friedman (1995) quanto os monetaristas
sustentam a visão de que a economia é inerentemente estável, exceto durante
períodos de perturbações monetárias, e rejeitam qualquer forma de políticas ativas,
seja fiscal ou monetária, como meio para estabilizar a economia. Eles consideram
que um mercado livre é intrinsecamente ligado à estabilização econômica.
Frente ao potencial de instabilidade das políticas macroeconômicas,
Friedman e Schwartz (1982) sugeriram substituí-las pela adoção de metas na
política econômica com a finalidade de neutralizar as perturbações decorrentes
dessas políticas. Essa proposta originou o sistema de metas de inflação e metas de
superávit primário, práticas adotadas em diversos países na atualidade. No entanto,
alguns pressupostos da corrente monetarista passaram a receber críticas,
principalmente em relação à formação das expetativas e ao ajuste gradual dos
mercados. Essas críticas levaram ao surgimento de uma nova escola, a novo-
clássico.
4. Novos-clássicos
Na década de 1970, a economia clássica passa por sua própria revolução
com a incorporação das expectativas racionais nos modelos de equilíbrio geral. Os
novos-clássicos
18
adotam as expectativas racionais
19
como parte integrante,
oferecendo uma perspectiva alternativa à teoria keynesiana nos modelos de ciclos
econômicos, ao mesmo tempo em que criticam a versão monetarista para a curva
de Phillips.
A crítica aos modelos da ntese-keynesianos surge devido à sua
incapacidade em explicar o fenômeno de estagflação na economia mundial na
década de 70, especialmente por meio da curva de Phillips, que sugere um trade-
off permanente entre desemprego e inflação. No que se refere à teoria monetarista,
a crítica se concentra na formação das expectativas dos agentes. Para os novos
clássicos, as expectativas são consideradas racionais levando em conta não
18
Os principais expoentes dessa corrente são Robert Lucas, Thomas Sargent, Robert Barro, Edward
Prescott e Finn Kydland.
19
A hipótese de expectativas racionais é categorizada em duas versões: a fraca e a forte. A versão
fraca postula que os agentes econômicos formulam suas expectativas sobre uma variável econômica
com base em todas as informações disponíveis sobre os fatores relevantes que eles consideram
como determinantes dessa variável. Por outro lado, a versão forte argumenta que as expectativas
dos agentes econômicos são equivalentes à esperança matemática da variável condicionada às
informações disponíveis até o período anterior à formação das expectativas. Em outras palavras, na
versão forte, as expectativas são moldadas o apenas por informões passadas, mas também
pela totalidade das informações dispoveis até o momento da formação das expectativas.
apenas a inflação passada, mas também a expectativa de crescimento da oferta de
moeda
20
.
Isso significa que os agentes antecipam a inflação com base na taxa de
expansão monetária esperada, ou seja, na taxa de crescimento da oferta monetária
que acreditam que o governo escolherá, considerando as informações observadas
nos períodos anteriores.
Segundo Lucas (1972), o comportamento da política monetária
governamental não é imprevisível (aleatório), mas sistemático e, portanto, passível
de previsão. Por exemplo, se diante de um choque não previsto
21
, que resulte em
uma insuficiência de demanda agregada, o governo adotar uma abordagem ativista,
expandindo a taxa de crescimento da oferta monetária, os agentes podem
inicialmente ficar surpresos. No entanto, eles aprenderão com essa experiência e
na próxima ocorrência do mesmo fenômeno. Os agentes anteciparão um aumento
na taxa de crescimento da oferta monetária e, por conseguinte, na taxa de inflação.
Assim, eles ajustarão suas expectativas de inflação, revisando contratos flexíveis
para refletirem as novas previsões, elevando a taxa de crescimento dos salários
nominais e, portanto, a taxa de inflação efetiva.
Caso o governo opte por não modificar a taxa de expansão da oferta
monetária em meio a uma recessão, os agentes não ajustarão suas expectativas
20
Isto é, πet = Mte em que πet é a inflação esperada no período t; Mte é a taxa de crescimento esperada
da oferta de moeda no período t.
21
Os agentes podem cometer erros de previsão mesmo na versão forte da hipótese de expectativas
racionais. Isso ocorre porque sua versão sugere que, em média, as previsões dos agentes são
precisas e o exibem viés sistemático ao longo do tempo, ou seja, não são consistentemente
equivocadas. No entanto, é fundamental notar que essa hipótese não implica uma previsão perfeita
da variável; tendo em vista a suposão de informão incompleta, os agentes podem cometer erros
em suas previsões.
de inflação. Assim, o histórico comportamento do governo na gestão da política
monetária funciona como um indicativo para os agentes sobre o comportamento
futuro do governo. Esses agentes, conforme Sargent, Fand e Goldfeld (1973),
utilizam essa indicação para estimar a taxa de inflação.
A credibilidade da equipe econômica é um elemento crucial. Considere a
hipótese de uma equipe econômica “linha dura” (reconhecida por não adotar uma
abordagem ativista na política monetária para reduzir o desemprego) que percebe
uma inflação considerada excessiva e busca reduzi-la. Nesse cenário, a equipe
econômica anuncia publicamente sua intenção de cortar substancialmente a taxa
de crescimento da oferta monetária, mesmo que isso resulte em um aumento do
desemprego.
De acordo com Lucas e Rapping (1969), caso os agentes econômicos
confiem na declaração da nova equipe econômica, ajustarão suas expectativas de
crescimento da oferta monetária conforme anunciado pelo governo, diminuindo,
consequentemente, suas previsões de inflação. Eles passarão a incorporar em
contratos de trabalho e listas de preços uma expectativa menor de inflação para o
futuro, resultando em uma redução imediata da taxa de inflação.
Portanto, para Lucas (1973), a divulgação de uma redução na taxa de
crescimento da oferta monetária, contanto que seja considerada crível, resulta
imediatamente em uma diminuição das expectativas de inflação e,
consequentemente, da inflação efetiva na mesma magnitude da queda na taxa de
crescimento da oferta monetária. Dessa forma, a taxa de crescimento da oferta real
de moeda permanece constante, assim como a taxa real de juros, investimento,
demanda agregada, produção e emprego.
Dessa maneira, a ideia de um trade-off temporário (conforme defendido pelos
monetaristas) ou permanente (como na curva de Phillips original) entre desemprego
e inflação é agora questionada e rejeitada. Para os novos-clássicos
22
, as políticas
fiscais e monetárias não exercem impacto na determinação do nível de equilíbrio da
economia, que está atrelado à sua taxa natural de desemprego.
Os novos clássicos, ao adotarem a hitese de expectativas racionais,
partem do pressuposto de que os agentes econômicos são competentes para
processar eficientemente todas as informações disponíveis e formar expectativas
que se alinham de maneira coerente com essas informações. Isso implica que os
trabalhadores não estão sujeitos à ilusão monetária, como proposto por Friedman
23
.
A taxa de desemprego divergiria da taxa natural na presença do que os novos
clássicos denominam como “surpresas” eventos que não foram previstos pelas
expectativas dos agentes econômicos.
Essas surpresas podem se materializar de diversas formas: como alterações
inesperadas na política econômica, choques de oferta ou demanda, eventos
geopolíticos imprevistos, entre outros. Contudo, no período subsequente, os
agentes incorporam essas novas informações ao seu processo de formação de
expectativas, reconduzindo rapidamente a economia ao seu equilíbrio de longo
prazo, ou seja, à taxa natural de desemprego
24
.
22
Vide Kydland e Prescott (1977).
23
Segundo Lucas (1972), o modelo de expectativas adaptativas pressupõe implicitamente que os
agentes econômicos são irracionais, uma vez que o utilizam a informação disponível de maneira
ótima. Por exemplo, no caso da ilusão monetária, o governo pode aumentar a oferta de moeda
período após período acelerando a inflação e enganando os trabalhadores. Nesse caso, os
trabalhadores o reagem antecipando o aumento da oferta de moeda pelo governo e, assim,
evitando perdas reais em seus salários.
24
Uma corrente novo-clássica, a escola dos ciclos reais de negócios abandona a hitese de
informação incompleta de forma que essas surpresas não podem ocorrer. Desse modo, as flutuações
Esse ajuste rápido é factível devido à flexibilidade dos preços e salários.
Diante de variações na oferta/demanda, as empresas podem ajustar seus preços
rapidamente, assim como os trabalhadores podem adaptar seus salários, corrigindo
desequilíbrios e reconduzindo a economia à sua taxa natural de desemprego.
Os novos clássicos o reconhecidos por darem destaque à ineficácia das
políticas monetárias e fiscais discricionárias para estabilizarem a economia. Eles
argumentam que, mesmo que tais políticas causem impactos a curto prazo, os
agentes econômicos ajustarão suas expectativas em resposta, neutralizando os
efeitos dessas políticas. Portanto, os novos clássicos demonstram ceticismo quanto
à capacidade de o governo intervir eficazmente na economia de forma
discricionária
25
.
Assim, os novos-clássicos preferem regras ao invés da discricionariedade na
condução da política econômica. O debate entre regras e discricionariedade ganhou
destaque na economia a partir do trabalho seminal de Kydland e Prescott (1977),
que argumentam que políticas econômicas discricionárias, mesmo quando bem-
intencionadas, podem levar a resultados subótimos devido a problemas de
credibilidade e inconsistência temporal.
A inconsistência temporal se refere à situação em que as autoridades
econômicas anunciam uma política com a intenção de segui-la no futuro, mas
econômicas de curto prazo deixa de estar relacionada a choques monetários não esperados, que
passam a ser explicados por choques tecnológicos aleatórios, o que para King e Plosser (1984) e
Kydland e Prescott (1990) podem ser mudanças na qualidade dos insumos, novas práticas de
gestão, o desenvolvimento de novos produtos e a introdução de novas técnicas de produção. Com
isso, afirma-se a neutralidade da moeda e o papel da oferta na determinação do produto.
25
Conforme Barro (1981) e Kehoe e Prescott (2007), essas políticas são completamente
desconsideradas e, na ausência de erros de expectativas, as variações nos veis de emprego e
produção passam a ser explicadas por choques exógenos de oferta, como alterações tecnológicas
e de produtividade, que resultam em mudanças nos pros relativos na economia.
depois mudam de direção quando chega o momento de implementá-la. Isso ocorre
porque as condições econômicas ou os incentivos podem mudar, levando a uma
quebra de compromisso. Por exemplo, um governo pode prometer manter uma
política de baixa inflação, mas depois, sob pressão política ou para estimular a
economia a curto prazo, decide expandir a oferta monetária, o que leva à inflação.
Os novos-clássicos argumentam que essa inconsistência temporal pode ser
evitada ao seguir regras claras e preestabelecidas, ao invés de confiar na
discricionariedade das autoridades. Ao adotar regras, como regras fiscais, metas de
inflação ou regras de crescimento da oferta monetária, as políticas econômicas se
tornam mais previsíveis e confiáveis, o que contribui para a estabilidade econômica
e a formação de expectativas racionais pelos agentes econômicos.
Na ausência de intervenção governamental, a economia é considerada
estável e as fontes de instabilidade que podem prejudicar o funcionamento dos
mercados são minimizadas. A abordagem novo-clássica sugere como solução
estabelecer políticas econômicas previsíveis, como no sistema de metas de inflação
e superávit primário, além de garantir a independência do banco central em relação
aos governos. Isso visa evitar emissões excessivas de moeda, direcionando a
política monetária exclusivamente para assegurar a estabilidade de preços.
Assim, ao concentrar-se na oferta agregada, a teoria novo-clássica reafirma
os principais pressupostos teóricos fundamentais da economia clássica. Isso inclui
o equilíbrio geral walsariano em que desequilíbrios são corrigidos pelo mecanismo
de mercado, via preços e salários fleveis, e a neutralidade da moeda, que postula
que uma expansão monetária não tem efeitos sobre as variáveis reais, mesmo no
curto prazo.
Entretanto, as correntes monetarista e novo-clássica não contemplam as
características essenciais da moeda, diferenciando-se, assim, da teoria monetária
de Keynes. Ademais, algumas hipóteses dessas correntes veem suas consistências
lógicas enfraquecidas quando confrontadas com a dinâmica comportamental das
modernas economias empresariais
26
.
Em momentos de grande incerteza, a moeda se converte em um ativo seguro
para proteção contra essa instabilidade. Nessas circunstâncias, as crises de
insuficiência de demanda efetiva e, consequentemente, desemprego se
materializam devido ao comportamento dos agentes, que retêm moeda em
situações de incerteza, adiando suas decies de gastos. Dessa forma, em
contraste com a visão de Friedman (neutralidade no longo prazo) e os novos
clássicos (neutralidade no curto e longo prazo), a moeda não se mostra neutra nem
no curto prazo nem no longo prazo.
Adicionalmente, a teoria novo-clássica enfrenta críticas devido à natureza
irrealista de suas hipóteses, as quais assumem ajustes instantâneos de todos os
preços no mercado, comportamentos ótimos por parte de todos os agentes de
acordo com seus objetivos e expectativas, além de uma formação otimizada de
expectativas. Ao contrário, a dinâmica observada nas economias mostra que elas
não convergem para uma situação de equilíbrio geral walrasiano, na qual a mão
invisível leva a economia a uma alocação eficiente dos recursos.
Frente a essas flutuações cíclicas, as expectativas dos agentes parecem ser
moldadas não por meio de um processo estocástico, mas sim referenciando o que
26
Vide Ferrari-Filho (1996).
Keynes denominou de “conhecimento incerto”. Esse conhecimento o se baseia
em expectativas matemáticas, uma vez que a base de cálculo não está presente.
Diante dessas críticas, parte da ortodoxia tenta construir modelos econômicos que
reflitam melhor as condições reais da economia, ao mesmo tempo que produzem
previsões válidas. Como resultado, surge a escola novo-keynesiana.
5. Novos-keynesianos
Os novos-keynesianos representam uma escola de pensamento econômico
que emergiu como uma resposta e uma evolução das ideias keynesianas clássicas,
adaptando-as ao contexto das economias modernas. Uma das contribuições mais
notáveis dessa escola é o uso de modelos DSGE (Dynamic Stochastic General
Equilibrium), que se tornaram ferramentas essenciais na análise macroeconômica
moderna. Além disso, os novos-keynesianos têm uma posição clara sobre a
preferência pela política monetária em relação à política fiscal como principal
instrumento de estabilização econômica.
Embora a escola novo-“keynesiana
27
apresente uma considerável
heterogeneidade, de maneira geral, Mankiw e Romer (1991) postulam que, para
classificar uma teoria como pertencente a essa escola, é necessário que ela
responda de forma afirmativa a ambas as seguintes perguntas:
i) A teoria em análise refuta a dicotomia clássica? Em outras palavras, ela
reconhece a possibilidade de que alterações em variáveis nominais,
27
Os principais autores que contribuíram para o desenvolvimento novo-keynesiano são: Joseph
Stiglitz, Paul Krugman, Oliver Blanchard, Gregory Mankiw, David Romer, e Peter Hansen.
como o estoque nominal de moeda, possam influenciar variáveis reais,
como o produto e o nível de emprego?
ii) Ela parte do pressuposto de que imperfeições reais de mercado na
economia, como competição imperfeita, informação imperfeita e rigidez
de preços relativos, desempenham um papel relevante na explicação das
flutuações econômicas?
A afirmativa inicial positiva denota a não neutralidade da moeda, originada
pela rigidez de preços, ao passo que a segunda evidencia a origem dessa rigidez,
destacando as imperfeições de mercado.
A teoria novo-keynesiana foi elaborada na década de 1980 com o propósito
de estabelecer uma estrutura teórica baseada nos prinpios microeconômicos da
macroeconomia keynesiana. Ela se apresenta como uma alternativa tanto à teoria
ntese-keynesiana quanto como uma crítica aos novos-clássicos.
Dos novos-clássicos foi herdada a fundamentação microeconômica e o
arcabouço de equilíbrio geral, além da hitese das expectativas racionais. Da
ntese neoclássica, os novos-keynesianos endogenizam a rigidez de preços e
salários. Todavia, no mundo novo-keynesiano reina a informação assimétrica, a
competição imperfeita, as firmas formadoras de preços, os mercados incompletos
e o trabalho heterogêneo. Assim, segundo Snowdon e Vane (2005), os adeptos da
perspectiva novo-keynesiana avançam além da ntese neoclássica e da escola
novo-clássica.
Nos anos 1970, vários economistas foram persuadidos pelos argumentos de
Lucas (1972) em favor das expectativas racionais e passaram a adotar a versão
novo-clássica da curva de Phillips. Entretanto, no final da cada de 1970, Fischer
(1977) evidenciou que os resultados da versão de Lucas, especialmente a
possibilidade de desinflação indolor, dependiam crucialmente não apenas da
presença de expectativas racionais, mas também da aceitação da plena
flexibilidade dos preços e contratos de trabalho.
Tanto Friedman (1968) quanto Lucas (1972) faziam uso desse pressuposto.
Por isso, em ambas versões da curva de Phillips, se as expectativas inflacionárias
fossem formadas corretamente, a economia estaria automaticamente em seu
equilíbrio de longo prazo. A única fonte potencial de desequilíbrio de curto prazo
eram os erros na formação de expectativas inflacionárias.
Fischer (1980) evidencia que, na presença de rigidez salarial, mesmo com
expectativas corretamente formadas, a economia o estaria constantemente em
seu equilíbrio de longo prazo. A rigidez salarial poderia introduzir a possibilidade de
desequilíbrio de curto prazo. Dessa forma, os novo-keynesianos concordam com
Lucas quanto à importância de utilizar o modelo de expectativas racionais na
formação de expectativas em oposição ao modelo de expectativas adaptativas
proposto por Friedman.
No entanto, os novo-keynesianos discordam tanto de Friedman quanto de
Lucas em relação à flexibilidade dos contratos: ao passo que para Friedman e Lucas
os contratos são considerados perfeitamente fleveis (como em um leiloeiro
walrasiano), os novo-keynesianos argumentam que os contratos, especialmente os
contratos de trabalho, são rígidos no curto prazo
28
.
28
Vide Fischer (1977).
Esses autores propõem, portanto, a existência de dois tipos de contratos de
trabalho no curto prazo: i) uma parcela dos contratos que é indexada, ou seja, que
têm seu valor corrigido apenas pela inflação passada, sem a capacidade de
incorporar mudanças para equilibrar o mercado de trabalho; ii) outra parcela, que é
flexível, ou seja, os contratos podem ser ajustados instantaneamente para
incorporar alterações que mantenham os mercados em equilíbrio, como mudanças
nas expectativas de inflação. Dessa forma, essa abordagem coloca as visões de
Friedman (ausência de flexibilidade) e novo-clássica (plena flexibilidade) como
extremos.
Para Blanchard (1984), dado que a economia, em geral, exibe algum grau de
rigidez nos preços e salários, a teoria novo-keynesiana representa uma média
ponderada das teorias de Friedman e novo-clássica. Quanto maior for a proporção
de contratos rígidos em relação ao total de contratos, mais essa teoria se assemelha
à versão de Friedman. Por outro lado, à medida que a proporção de contratos
flexíveis aumenta em relação ao total de contratos, ela se torna mais similar à versão
de Lucas.
No entanto, a longo prazo, todos os contratos são considerados fleveis, o
que implica que não diferenças nos resultados das políticas monetárias em
comparação com as versões de Friedman e Lucas. No curto prazo, devido à rigidez
dos contratos salariais, mesmo sob uma equipe econômica com credibilidade o
ativista estabelecida, ao contrário da versão novo-clássico, mesmo com
expectativas racionais e com os agentes acreditando plenamente na política
anunciada, não ocorre desinflação indolor.
Em resumo, a versão novo-keynesiana da curva de Phillips
29
leva a
conclusões sobre os resultados da política monetária no curto e no longo prazo que
são semelhantes à versão de Friedman. No entanto, as fundamentações tricas
que levam a essas conclusões são distintas.
De acordo com os novos-keynesianos, a síntese neoclássica carece de uma
explicação lógica para a rigidez de preços e salários, assim como a análise novo-
clássica dos microfundamentos da macroeconomia, que se baseia em modelos de
market-clearing
30
, é inadequada para explicar por que a função de oferta agregada
não se altera quando ocorrem choques de demanda.
Portanto, para Stiglitz e Greenwald (1987), os novos-keynesianos se
concentram em analisar o que consideram ser a questão central na teoria de
Keynes: a rigidez de preços e salários. A variação do produto, assim como a
existência do desemprego involuntário, decorrem de uma falha de mercado que,
neste caso, é a rigidez de preços e salários.
Ao contrário dos novos-clássicos, os novos-keynesianos adotam a estrutura
de mercados imperfeitos ou não competitivos. Na visão dos novos-keynesianos, a
rigidez de preços impede o equilíbrio automático do mercado. No entanto, é
importante destacar que a rigidez o implica em preços fixos, mas sim que os
preços se ajustam lentamente em direção ao equilíbrio.
29
Mankiw e Reis (2002) apresentam essa formulação da Curva de Phillips, além de oferecer uma
alternativa a essa abordagem.
30
Market-clearing é um termo usado na economia para descrever uma situação em que a oferta e
a demanda em um mercado se igualam, resultando em um equilíbrio onde o excesso de oferta
nem de demanda. Em outras palavras, o mercado é "limpado" ou "equilibrado" porque todas as
unidades de um bem ou servo disponíveis são compradas ou vendidas ao pro de equilíbrio.
Dessa maneira, a perspectiva dos novos-keynesianos é que, no longo prazo,
quando os preços e salários são fleveis, poderia ocorrer o equilíbrio automático
do mercado, eliminando o desemprego involuntário. Nesse cenário, a abordagem
microeconômica walrasiana seria relevante enquanto a macroeconomia keynesiana
perderia sua utilidade. Em outras palavras, no longo prazo, haveria uma
convergência com a teoria novo-clássica.
Os novos-keynesianos atribuem a rigidez de preços no mercado de bens ao
chamado custo de menu. Esse custo inclui despesas relacionadas à etiquetagem,
campanhas para informar sobre mudanças de preço e o tempo dedicado a discutir
a própria alteração de preços.
Conforme Mankiw (1985) e Mankiw e Romer (1991), essa explicação justifica
por que uma diminuição na demanda resulta na redução da produção em vez da
diminuição de preços. Isso indica que a ideia de custo de menu está associada ao
poder de monopólio das empresas
31
. Assim, o custo de menu esclarece por que as
empresas não adotam decisões para restaurar o equilíbrio original diante de uma
queda na demanda.
Segundo Mankiw (1997), a inflexibilidade de preços também pode ser
atribuída à falta de coordenação entre as empresas. Se cada empresa acreditar que
as outras não reduzirão seus preços, elas também se abstêm de fazê-lo.
Consequentemente, os preços permanecem inflexíveis porque cada empresa
espera essa rigidez, mesmo que essa inflexibilidade seja prejudicial a todas.
31
No mundo novo-keynesiano, as firmas são price setter, ou seja, formadoras de pros.
Portanto, uma diminuição na demanda não resulta em redução de preços, mas sim
em queda na oferta.
A inflexibilidade dos salários ou os desequilíbrios no mercado de trabalho o
explicados pela existência do chamado salário de eficiência. De acordo com Yellen
(1984), mesmo diante do desemprego, as empresas optam por não reduzir o salário
real para manter a eficiência do trabalhador, ou seja, para preservar a produtividade
do trabalho inalterada. Assim, a produtividade do trabalho é influenciada pelo salário
pago pelas empresas; qualquer redução salarial resulta na queda da produtividade
e, consequentemente, dos lucros. Nesse contexto, as empresas evitam diminuir os
salários por temerem a redução da produtividade e dos lucros a ponto de
comprometer sua participação no mercado.
A partir da suposição de que a mão de obra não é homogênea, os novos-
keynesianos esclarecem a relação entre o salário real e a produtividade de rias
maneiras
32
: i) funcionários com salários reais mais baixos demonstram menor
lealdade à empresa, mostrando menos dedicação ao trabalho; ii) salários reais
menores resultam na perda dos trabalhadores mais qualificados, sendo absorvidos
os de qualificação inferior, configurando um problema de seleção adversa; iii) uma
redução nos salários reais tende a tornar os trabalhadores irresponsáveis em suas
funções, aumentando o risco de demissão devido a um problema de risco moral.
Os novos-keynesianos sustentam que a rigidez salarial não se deve apenas
à manutenção da produtividade da firma, mas também pode ser explicada, segundo
Gordon (1990), pela abordagem insider/outsider. Os insiders são trabalhadores
32
Mankiw (1990).
experientes, qualificados e afiliados a sindicatos fortes, os quais protegem seus
empregos por meio de rios custos de demissão que tornam inviável para a
empresa dispensá-los. Em contraste, os outsiders são trabalhadores não
qualificados que estão desempregados involuntariamente, não contando com a
proteção sindical. Embora os outsiders desejem trabalhar por um salário inferior ao
pago aos insiders, os custos associados à demissão de um insider e à contratação
de um outsider, incluindo o treinamento deste último, tornam essa substituição
pouco atrativa. Portanto, a rigidez salarial imposta pelos insiders é maior do que a
flexibilidade desejada pelos outsiders.
Diante dessas considerações, a empresa não possui incentivo para diminuir
o salário real uma vez que essa redução resultaria em perda de produtividade.
Portanto, quanto maior o impacto na produtividade, menor é o estímulo para a
empresa reduzir os salários reais. Assim, a presença de imperfeições de mercado
cria poder tanto para as empresas quanto para os trabalhadores, explicando o
desemprego involuntário. Isso ocorre porque há trabalhadores dispostos a aceitar
salários menores do que o valor pago aos trabalhadores empregados. Esse
desemprego involuntário é estrutural e persiste mesmo em situações de pleno
emprego, tornando-se imune a políticas expansionistas, pois estas não têm impacto
real na economia. No entanto, é possível reduzi-lo por meio de políticas voltadas
para o lado da oferta, como aquelas que diminuem o poder de negociação dos
sindicatos.
Dessa maneira, o salário de eficiência atua como um obstáculo à redução do
salário real, que, de acordo com a teoria clássica do emprego, eliminaria o excesso
de oferta de mão de obra. Assim, o salário de eficiência se configura como mais um
elemento que contribui para a rigidez de preços, impedindo o ajuste automático do
mercado de trabalho.
No entanto, a rigidez de preços e salários não é considerada por Keynes
como condição necessária ou suficiente para a existência de desemprego
involuntário, como demonstrado por Dutt e Amadeo (1988). Keynes demonstrou que
esse fenômeno pode ocorrer mesmo em situações de flexibilidade de preços e
salários. Assim, para Keynes, as flutuações econômicas surgem devido à o
neutralidade da moeda em uma economia monetária de produção. Portanto, a
adjetivação como “keynesiana” decorre de uma interpretação equivocada da Teoria
Geral. Como forma de mostrar tal equivoco, a próxima seção mostra os princípios
teóricos da escola pós-keynesiana.
6. Pós-keynesianos
Os economistas pós-keynesianos constituem uma escola de pensamento
que se posiciona como uma crítica fundamental ao mainstream econômico,
incluindo tanto os novos-clássicos quanto os novos-keynesianos. Um dos conceitos
centrais na crítica pós-keynesiana é a tese da “falácia de composição”, que oferece
um contraponto poderoso às suposições que muitas vezes sustentam as análises
econômicas convencionais.
A falácia de composição é a ideia de que o que é verdade para uma parte de
um sistema o necessariamente o é para o sistema como um todo. Em outras
palavras, comportamentos racionais ou benéficos para indiduos ou empresas,
quando aplicados por todos simultaneamente, podem levar a resultados agregados
indesejáveis ou até prejudiciais, como é o caso do paradoxo da parcimônia
33
.
Portanto, os pós-keynesianos constituem uma corrente heterodoxa no campo
da economia que compartilha certas ideias fundamentais com a teoria keynesiana,
mas também expande e desenvolve essas concepções de maneiras distintas.
Enquanto a teoria keynesiana convencional destaca a relevância da demanda
agregada, do desemprego involuntário e das imperfeições de mercado, os pós-
keynesianos vão além integrando diversas abordagens e enfatizando diferentes
aspectos macroeconômicos.
Assim como Keynes, os pós-keynesianos enfatizam a importância da
demanda efetiva como um motor central da atividade econômica. Eles acreditam
que o nível agregado de demanda desempenha um papel crucial na determinação
do emprego e da produção na economia.
Ao contrário dos novos-clássicos e novos-keynesianos, os s-keynesianos
reconhecem a presença de incerteza e a limitação da racionalidade perfeita dos
agentes econômicos. Eles argumentam que as expectativas e o comportamento
humano muitas vezes são guiados por heurísticas e regras de tomada de decisão
que podem ser o-racionais em certas circunstâncias.
De acordo com Kerr (2005), os pós-keynesianos podem ser divididos em
duas correntes distintas. A primeira se refere à chamada escola de Cambridge
34
, na
33
Segundo este paradoxo, se todos os indivíduos ou empresas decidem aumentar suas poupanças
ao mesmo tempo (por exemplo, durante uma recessão), isso pode levar a uma queda na demanda
agregada, resultando em menor prodão, desemprego e, ironicamente, menor poupança total na
economia. O comportamento prudente de poupar, que pode ser sensato a nível individual, se torna
prejudicial quando adotado por todos ao mesmo tempo.
34
Kaldor e Pasintti são os principais representantes dessa corrente.
qual a análise se concentra na teoria do crescimento e da distribuição de renda.
Nesse contexto, são empregados modelos formais com soluções analíticas
fechadas, considerando o equilíbrio como um estado de repouso do sistema
econômico. A segunda corrente é conhecida como keynesianismo
fundamentalista
35
, que direciona sua atenção para o tríplice impacto de tempo,
incerteza e moeda na dinâmica das economias capitalistas rejeitando abordagens
baseadas em equilíbrio.
A origem da primeira corrente remonta aos modelos de crescimento
desenvolvidos por Harrod (1970) e Domar (1970), os quais buscaram ampliar as
conclusões de Keynes para o longo prazo. Nesse enfoque, a renda se torna a
variável de ajuste entre as decies de poupança e investimento. Dessa maneira,
esses dois autores apresentaram uma situação de equilíbrio com desemprego
involuntário, considerando um cenário em que o estoque de capital crescesse de
forma contínua ao longo do tempo.
Embora o resultado fosse viável, suas chances de ocorrer eram reduzidas.
Era pouco provável que a economia seguisse uma trajetória de crescimento estável
com pleno emprego. Em vez disso, tenderia a alternar entre períodos de
crescimento acelerado e fases de declínio acentuado na atividade econômica,
resultando em níveis elevados de desemprego.
Conforme Oreiro (2011), a incongruência desse resultado com a experiência
histórica das economias capitalistas desenvolvidas entre 1950 e 1973 levou autores
35
Economistas como Paul Davidson, Jan Kregel, Cardim de Carvalho e Possas são autores
proeminentes nessa corrente s-keynesiana.
pós-keynesianos, como Kaldor (1958) e Pasinetti (1962), a elaborarem modelos nos
quais a trajetória de crescimento de longo prazo é estável e marcada pelo pleno
emprego. Dessa forma, eles formulam uma nova teoria da distribuição funcional da
renda na qual a participação dos salários e dos lucros na renda se torna a variável
de ajuste entre as decisões de poupança e investimento.
O propósito era criar um mecanismo em que o investimento determinasse a
poupança, de modo que uma alteração no investimento resultasse em uma variação
equivalente na poupança devido aos efeitos dessa mudança na distribuição de
renda entre salários e lucros.
A segunda corrente surgiu na década de 1970 como uma resposta crítica à
ntese keynesiana-neoclássica que defendia a presença de desequilíbrios no curto
prazo devido a fatores institucionais que restringiam ou limitavam a flexibilidade de
preços e salários nominais. Entretanto, essa situação de desequilíbrio era
considerada temporária, uma vez que, a longo prazo, os preços e salários se
tornariam completamente fleveis. Isso implicava, segundo Oreiro (2011), que a
macroeconomia keynesiana estava confinada ao curto prazo, enquanto a
macroeconomia neoclássica prevaleceria no longo prazo.
Essa segunda corrente pós-keynesiana, que também ficou conhecida como
keynesianos americanos, divergiu da primeira vertente ao criticar sua interpretação
das questões macroeconômicas no início da década de 1970. Para Davidson (1978)
e Minsky (1982), a característica essencial do pensamento keynesiano não residiria
na rigidez dos preços e salários nominais, mas sim na análise dos efeitos da
presença de incerteza não probabilística sobre o comportamento e as decies dos
agentes econômicos, especialmente as relacionadas à determinação da riqueza.
Os s-keynesianos sustentam que a incerteza fundamental em relação ao
futuro é uma característica inerente à economia. Em oposição à noção de que os
agentes econômicos podem prever o futuro com precisão, os pós-keynesianos
destacam a existência de incertezas radicais que tornam impossível uma previsão
exata.
Diferentemente dos novos clássicos e da ortodoxia em geral, o mundo de
Keynes e dos pós-keynesianos é não-ergódico
36
, isto é, a inferência adequada do
comportamento futuro não pode ser derivada do comportamento passado e as
características do sistema econômico podem mudar ao longo do tempo. A não-
ergodicidade destaca a complexidade dinâmica dos fenômenos econômicos, nos
quais as condições e comportamentos dos agentes podem evoluir de maneira não
linear e imprevisível
37
.
A presença de incerteza leva os agentes econômicos a adotarem
comportamentos defensivos, como a preferência pela liquidez. Dado que a moeda
é o ativo mais líquido, ela passa a ser um substituto para outros ativos no portfólio
dos tomadores de decisão. Consequentemente, um aumento na preferência pela
liquidez leva os agentes a trocarem ativos menos líquidos por moeda, tornando esta
não neutra tanto no curto quanto no longo prazo, pois pode impactar o ritmo de
acumulação de capital. Portanto, essa segunda corrente pós-keynesiana busca,
conforme Carvalho (1988a) e Pahim e Morrone (2023), desenvolver a visão de
36
Em termos simples, a ergodicidade se refere à propriedade de um sistema estocástico no qual a
média temporal de uma variável aleatória converge para o valor esperado à medida que o tempo
avança.
37
Sobre a questão da o-ergocidade, vide Carvalho (1992), Davidson (1984) e Campos e Chiarini
(2014).
mundo de Keynes apresentada na Teoria Geral, na qual está incorporado o conceito
de economia monetária de produção.
A distribuição funcional da renda, dividida entre salários e lucros,
desempenha um papel crucial na determinação da taxa de crescimento econômico
a longo prazo devido aos seus impactos nas decies de investimento em capital
fixo. Dessa forma, o crescimento econômico é endógeno e seu impulso está
relacionado ao investimento em capital fixo.
Portanto, a teoria pós-keynesiana identifica diferentes padrões de
causalidade entre crescimento e distribuição de renda, elaborando modelos que
podem resultar em múltiplos equilíbrios devido às propriedades dimicas das
economias capitalistas, demonstrando que as economias de mercado o sistemas
intrinsecamente instáveis
38
. Essa instabilidade faz parte da própria estrutura dessas
economias, sendo independente da ocorrência de choques exógenos. Assim, como
demonstra Minsky (1986) e Gevorkyan (2023), não um mecanismo de mercado
capaz de conduzir a economia a uma trajetória estável de crescimento econômico,
como na teoria clássica.
A instabilidade nas economias de mercado pode surgir da interação
39
intricada entre diversos fatores, incluindo a relação não linear entre a distribuição
funcional da renda e o grau de utilização da capacidade instalada, assim como a
38
Esses modelos ficaram conhecidos como do tipo wage-led e profit-led, tendo inspirão em Kaldor
(1956) e Pasinetti (1962), e se desenvolveram com Kalecki (1954), Steindl (1956), Marglin (1984),
Marglin e Bhaduri (1990), Dutt (1994) e Lima (2000).
39
As interões entre as variáveis econômicas são caracterizadas por o linearidades,
influenciadas por diversos fatores, como a presença de rendimentos crescentes e efeitos-renda mais
pronunciados do que os efeitos de substituição, entre outros. É essa não linearidade que produz
múltiplas posições de equibrio.
influência de fatores financeiros, como a relação entre o nível de endividamento das
empresas e as taxas de juros dos empréstimos bancários.
Em suma, a escola pós-keynesiana representa uma vio crítica e uma
evolução das ideias de Keynes, incorporando uma análise mais detalhada das
instituições financeiras, relações de crédito e uma compreensão mais profunda das
dimicas reais da economia. Essa abordagem destaca a complexidade do sistema
econômico e busca oferecer uma compreensão mais holística e contextualizada dos
fenômenos econômicos.
7. Considerações finais
A escola neoclássica dominou o pensamento econômico até a crise dos anos
1930. Até a publicação da “Teoria Geralpor Keynes, os neoclássicos prescreviam
um conjunto de políticas econômicas consideradas ideais para o adequado
funcionamento da economia.
Em síntese, esse conjunto de políticas econômicas abrangia a neutralidade
da moeda, a flexibilidade de preços e salários para promover o equilíbrio de
mercado, a validade da Lei de Say, o livre mercado e o equilíbrio orçamentário.
No entanto, o paradigma de pesquisa clássico falhou em explicar os eventos
que se desenrolaram após a crise de 1929, pois não contemplava a possibilidade
de desemprego involuntário e a subutilização da capacidade produtiva. Por
contraste, em 1936, Keynes publicou a Teoria Geral do Emprego, do Juro e da
Moeda, um livro que transformaria a teoria econômica, rompendo com o paradigma
de pesquisa anterior.
As contribuições de Keynes tiveram um impacto significativo no
desenvolvimento da teoria econômica, originando diversas correntes de
pensamento tanto na ortodoxia quanto na heterodoxia, representando
verdadeiramente uma revolução no sentido Kuhniano. Diante disso, o propósito
deste artigo foi de examinar a trajetória da teoria econômica no mainstream após
as críticas de Keynes e a continuidade de suas ideias pela escola pós-keynesiana,
enfatizando as similaridades e diferenças entre as distintas correntes do
pensamento econômico analisadas.
Inicialmente a resposta da escola neoclássica foi tentar incorporar as
contribuições de Keynes, solucionando as principais críticas e colocando as teorias
keynesianas como respostas aos problemas econômicos de curto prazo. Políticas
fiscais afetariam o emprego e a produção no curto prazo, a moeda seria não neutra
e os preços, rígidos. No entanto, no longo prazo, os pressupostos da teoria
neoclássica que Keynes criticou voltariam a prevalecer na economia.
Assim, na interpretação da síntese-neoclássica keynesiana, a teoria
keynesiana seria um caso particular da teoria neoclássica. Para explicar a inflação,
essa síntese fez uso da curva de Phillips, na qual defendia um trade-off permanente
entre desemprego e inflação mesmo no longo prazo.
A corrente monetarista passou a contestar os resultados teóricos da síntese-
neoclássica keynesiana, argumentando em favor de um papel central da oferta de
moeda na determinação da produção. Entendiam que políticas econômicas que
objetivam manter o desemprego abaixo da taxa natural resultariam no aumento da
inflação no longo prazo. Além disso, adotam o conceito de expectativas adaptativas
e defendem a inexistência de um trade-off permanente entre desemprego e inflação
no longo prazo. Esse trade-off ocorreria apenas em cenários nos quais os agentes
não formulariam corretamente suas expectativas, mas mesmo assim esse trade-off
seria corrigido com o tempo. Portanto, os monetaristas deixam de lado vários
princípios de inspiração keynesiana da síntese neoclássica keynesiana,
reservando-a a um erro de expectativas dos agentes econômicos.
Os novos clássicos avançam nesse sentido, incorporam o conceito de
expectativas racionais, preços e salários fleveis no curto e longo prazo e, assim,
recuperam completamente o leiloeiro walrasiano. Com efeito, o trade-off entre
desemprego deixa de existir até mesmo no curto prazo, passando a ocorrer
somente quando os agentes econômicos são surpreendidos pelas autoridades
monetárias. O desemprego involuntário ocorreria apenas diante do que os novos-
clássicos denominaram de surpresa de Lucas, mas sendo rapidamente incorporado
às expectativas e ao desequilíbrio corrigido automaticamente pelo mercado.
Os novos-keynesianos tentam fazer uma releitura dos escritos de Keynes,
mas sem descartar elementos da teoria neoclássica. Reconhecem a rigidez de
preços e salários no curto prazo, explicados pelas imperfeições dos mercados, e
enfatizam o papel das expectativas racionais ponderadas pela rigidez da economia.
Todavia, no longo prazo, qualquer desequilíbrio do mercado seria resolvido via
flexibilidade de preços e salários, prevalecendo a validade das teorias e dos
pressupostos neoclássicos. Novamente, embora reconheça avanços dessa
interpretação keynesiana em relação à síntese neoclássica keynesiana, a
incorporação de “Keynes” fica restrita a um caso particular da teoria dominante ao
curto prazo.
Por outro lado, a escola pós-keynesiana mantém muitos dos prinpios
fundamentais de Keynes, incluindo a ênfase na demanda efetiva, a rejeição da
neutralidade da moeda em qualquer prazo e a importância das expectativas na
determinação do comportamento econômico. Em contraste com a abordagem das
expectativas racionais, que assume que os agentes têm acesso completo à
informação, os pós-keynesianos destacam a incerteza fundamental na tomada de
decies econômicas, como Keynes de fato fez em suas teorias.
Os s-keynesianos passaram a desenvolver teorias considerando o papel
da moeda e a incerteza, examinando como as condições financeiras afetam as
decies econômicas. Keynes considerou as instituições econômicas e as
estruturas de mercado como elementos importantes na formação de políticas
econômicas. Os pós-keynesianos expandiram essa análise, examinando mais
profundamente as implicações institucionais na dinâmica econômica. Políticas
econômicas ativistas para estabilizar a economia também são defendidas por essa
corrente do pensamento econômico.
Em resumo, a escola pós-keynesiana o apenas abraça as ideias
fundamentais de Keynes, mas também expande e desenvolve essas ideias em
resposta a mudanças nas condições econômicas e em debates teóricos
subsequentes. A contribuição de Keynes é central para a formação e evolução
contínua da escola pós-keynesiana, mas também se encontram presentes
respingos keynesianos no desenvolvimento da teoria econômica dominante ao
longo do da história do pensamento econômico.
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